terça-feira, 17 de abril de 2007

Em busca da terra prometida

A exemplo de todos nós, não se sabe quando o comandante Fidel Alejandro Castro Ruz partirá desta para melhor, mas se um dia ele vier a faltar, como gostava de ameaçar o saudoso Roberto Marinho à equipe, prevê-se tragédia de proporções maremóticas nas 90 milhas infestadas de tubarões que separam a ilha comunista de Cuba e as reacionárias praias de Miami.
Fidel está negociando com a morte e está se saindo bem. Mesmo assim, a guarda costeira dos Estados Unidos voltou a promover na semana passada a operação coordenada pelo Homeland Security Department, com 325 agentes em treinamento para eventual fuga em massa da ilha. Algo em torno de meio milhão de cubanos, estimam.
Pouca gente se dá conta de que, com a regularidade das ondas, ainda aportam nas praias de Miami homens, mulheres, crianças cubanas, os balseros, tema do documentário homônimo que faz sucesso nos EUA sobre a fuga de mais de 50 mil cubanos em meados da década passada, o que obrigou o então presidente Clinton a devolvê-los à terra natal pela Base de Guantánamo, território norte-americano no outro extremo da ilha.
Nada que se equipare à diáspora de quase 124 mil hermanos que fugiram em 1980 pelo Porto de Mariel (homenagem à neta do escritor Ernest Hemingway, ex-morador) em improvisadas barcaças feitas de restos de madeira, painéis de zinco, câmaras pneumáticas e lençóis no papel de velas, muitos deles devorados por tubarões.
Tudo isso não aconteceria caso o governo americano, rendido pelos votos da comunidade cubana da Flórida, suspendesse o embargo econômico e financeiro imposto à ilha desde 1962 para forçar a volta da democracia a um país com um PIB de US$ 40 bilhões, tão vital para o comércio internacional como o Largo da Batata em São Paulo o é para o Cone Sul.
Bastasse que os empresários norte-americanos fossem liberados para instalar milhares de McDonald’s, Starbucks e Citibanks em Cuba, irrigando as veias da economia, que a modorrenta ditadura castrista iria para os ares transformando a ilha em um dos principais destinos de turismo do mundo, em especial o crescente turismo de negócios.
No entanto, como se a paciência dos cubanos fosse infinita, com suas filhas PHD mergulhando na prostituição e os filhos dourando-se em Engenharia Naval num país com muito mar mas sem navios, ficam Fidel Castro, de um lado, e sucessivos americanos, de outro, esquentando o que sobrou da Guerra Fria.
Castro, figura de museu que já passou por dez presidentes norte-americanos e que nos seus melhores anos tentou mudar o dia do Natal para não atrapalhar a safra de cana, viveu até agora levantando seu povo contra uma ameaça que não existe mais – o imperialismo norte-americano, figura de linguagem que esconde o senso comum: lutar por uma vida melhor que inclua, como dizem os balseros no documentário, um carro, uma casa e uma boa mulher.
Outros ditadores, como o filhinho-de-papai Kim Jong-il da Coréia do Norte, ou o sóbrio persa Ahmadinejad, do Irã, ou este inexplicável e fora de moda furacão venezuelano Hugo Chaves escolhem o imperialismo americano como inimigo público número um, e unem seu povo e se perpetuam no poder contra uma pretensa ameaça externa.
É por isto que Estados Unidos e Cuba, como irmãos que brigam há mais de 40 anos e jamais voltaram a se falar, vivem inalterados em suas posições, pois assim Fidel (ou seu irmão Raúl) se inoculam no poder e a comunidade da Flórida tem alguém com quem brigar. Afinal, a pior coisa que pode acontecer com os cubanos-americanos é terem de abandonar os EUA e voltar a uma ilha destruída por quase meio século de comunismo.
Assistindo ao documentário Balseros, vêm à tona milhares de histórias de famílias partidas, amores desfeitos, bens desapropriados, um turbilhão de desagregação social com pitadas de salsa, rumba, e muito charuto. Imagens da opulência norte-americana, país “demasiado perfeito” para os latinos, entremeadas com as favelas de Cuba, carros caindo aos pedaços, gente descalça morena, quase sem roupa, mas, como no Brasil, sorridente e feliz.

Você quer dinheiro?

Na onda de matança serial dos intermediários, sejam eles corretores, varejistas, publicitários (e até nós, jornalistas), internet e seus 1,1 bilhão de usuários preparam-se agora para atacar o sistema bancário, começando pelos Estados Unidos.
Como se sabe, banco é um negócio simples, inventado no século 18 a.C. na antiga Babilônia, para unir quem empresta dinheiro e quem quer dinheiro, pagando-se por isto uns tostões a mais a título de juros. O sistema foi aprimorado, milênios depois, pelos brasileiros, que inventaram os juros compostos, ou juro sobre juro, capazes, realmente, de levar para o espaço qualquer conta do cheque especial.
Vejam o exemplo do
www.prosper.com, um site norte-americano que, ao invés de namorados, tribos ou torcidas, une aplicadores e tomadores, como nos tempos babilônicos. A exemplo do www.zopa.com (este de origem britânica), o Prosper faz sucesso pela simplicidade: exige apenas a carteira de motorista, o número de seu seguro social e o endereço residencial para que você empreste ou tome emprestado.
Os juros são exorbitantes para os países civilizados (em média 7% ao ano – isto mesmo, ao ano), mas na selvageria monetária brasileira soam como aqueles empréstimos de pai para filho.
Os banqueiros já estão de cabelo em pé com estes sites, já que eles revolucionam um antigo (e ultrapassado) modelo de negócio que, só nos Estados Unidos, movimenta mais de US$ 60,5 trilhões em ativos, financiando principalmente a gastança dos governadores – sejam eles republicanos ou democratas. Bem parecido com o Brasil.
Quando falam sobre estes sites, banqueiros e bancários soltam impropérios sobre (1) a falta de segurança nas transações, (2) risco de crédito nas operações e (3) “nada melhor do que o olho-no-olho na hora de emprestar dinheiro”. Mas como quem xinga ou grita na verdade está com medo, deduz-se que estes sites tendem não a dominar, mas incomodar muito este sistema. E em curtíssimo prazo.
O pulo do gato está naquilo que os banqueiros acham que são melhores que o restante da humanidade: a arte de concessão de crédito. Tanto a Prosper quanto o Zopa baseiam-se no fantástico Grameen, o banco dos pobres inventado pelo bangladeshiano Muhammad Yunus em1972 em sua terra natal (depois de formar-se nos Estados Unidos).
O Grameen só empresta pequenas quantias para mulheres, e principalmente mulheres em associações ou grupos. Por que? Porque mulher não gasta dinheiro no boteco na volta de casa e, unidas, cobram (ou ajudam) umas às outras o pagamento destes empréstimos. Os sites também partem do mesmo princípio, só que homem lá também tem vez.
Em poucos minutos, você consegue até US$ 5 mil, desde que preencha os requisitos básicos. Um deles é ter um bom nível de crédito, o chamado credit score, um índice que, aqui, separa os norte-americanos entre bons e maus pagadores. Pode tornar sua vida um céu ou um inferno em plena Terra.
O outro – e talvez o mais importante de tudo – é que você tem de inventar um grupo, uma banda, uma associação, uma trupe para obter o rico dinheirinho, e ainda se responsabilizar pelo pagamento. Aproveita-se, aí, do chamado “fator vergonha”. Se um brother (ou na maioria das vezes, uma sister) não paga a conta, fica malvisto na parada.
Enfim, estamos falando de um mundo novo, sem gerentes, agências suntuosas, taxas bancárias, estouros do cheque especial e toda esta relação (muitas vezes conflituosa) que temos com o dinheiro ou com quem o guarda ou empresta – os bancos.
Durante milênios, eles fizeram um papel fundamental para a sociedade, especialmente quando eram apenas indutores do desenvolvimento financiando os empreendedores, este sim o coração e a alma do capitalismo.
Hoje, porém, informação virou commodity. Qualquer pessoa pode fazer um raio-X econômico, financeiro e moral no próximo (vejam o site privateye.com) antes mesmo que qualquer departamento de crédito o faça. Pode saber se a pessoa (ou empresa) paga suas contas em dia, tem passado na polícia ou na Justiça, se tem currículo vitae ou folha corrida.
Ou seja, se é um bom cliente. Simples, não é?

Não é Deus, mas está quase lá

Não existe marca mais poderosa no mundo do que a presidência dos Estados Unidos. Embora o ex-presidente Bill Clinton comparasse o cargo a um cemitério (“você dá ordens e ninguém ouve”), comandar o país mais poderoso do mundo significa ter influência sobre o destino de bilhões de pessoas, o meio ambiente, a economia global e o futuro do mundo. O presidente não é um Deus, como Antônio Carlos Magalhães na Bahia, mas está quase lá.
Esta marca é tratada com imenso carinho e referência pelos americanos, não importa quem esteja no cargo. O que pouca gente leva em conta é que, por trás deste culto à Presidência, existe um fantástico sistema de marketing que só o dinheiro e o poder podem comprar, uma verdadeira máquina de propaganda descrita no livro “All The President’s Spin”, recém-lançado nos Estados Unidos.
O presidente não dá um passo, não aparece em público ou fala uma frase sequer sem o apoio de um exército de assessores de imprensa, pesquisadores de opinião, assessores políticos, gente de cerimonial e seguranças, o chamado Serviço Secreto.
Mas a história parece ser ingrata. Por mais que tentem mudar o mundo quando estão no poder, quando deixam o cargo são lembrados apenas por frases que disseram, sejam boas ou más. Como Kennedy, (“não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país”), Nixon (“eu não sou um escroque”), Reagan (“derrubem o Muro de Berlim”) ou Clinton (“nunca tive relações sexuais com esta senhora”) referindo-se à estagiária Monica Lewinsky.
O presidente ganha US$ 400 mil por ano, com todas as despesas pagas. É o salário mais alto de um funcionário público nos Estados Unidos. É um trabalho difícil, arriscado (até hoje quatro presidentes já foram assassinados, quatro morreram durante o mandato de causas naturais, um renunciou e dois sofreram processos de impeachment) e estressante. O nível de pressão a que é submetido um presidente pode ser visualizado ano a ano pelos fotos publicadas nos jornais.
Para ser eleito, o candidato precisa ter nascido nos Estados Unidos (o que impediria uma eventual eleição de Arnold Schwarzenegger, governador da Califórnia) e ter mais de 35 anos. As mordomias incluem morar num endereço exclusivo de Washington e glamurosos deslocamentos. Não há nada que signifique mais poder do que voar no Air Force One (um Jumbo 747 de onde pode exerce a Presidência de qualquer ponto da Terra) ou no Marine One (um super-helicóptero).
Mas como o ex-presidente Fernando Henrique gosta de lembrar, bom mesmo é ser ex-presidente. Jimmy Carter (81 anos) já ganhou o Prêmio Nobel da Paz, escreveu 12 livros e dirige uma bem-sucedida fundação de direitos humanos. Gerald Ford (92), um antigo jogador de futebol americano e único presidente até hoje não eleito (foi indicado pelo Congresso com a renúncia do vice-presidente de Nixon), joga golfe diariamente. George Bush, o pai, é o que mais viaja. Gastou US$ 54 mil em passagens de primeira classe no ano passado – todo ex-presidente tem direito, também, a US$ 96 mil por ano para pagar assessores.
Bill Clinton é o que mais gasta. O Governo paga US$ 460 mil de aluguel da sua mansão perto de Nova York, US$ 54 mil de contas telefônicas e US$ 146 mil na rubrica e “outras despesas”. O que ele ganha com conferências dá inveja em Fernando Henrique (ambos têm os mesmos agentes): US$ 850 mil por ano, fora o adiantamento de US$ 10 milhões para escrever sua biografia publicada no ano passado, talvez o livro mais chato que já existiu sobre a face da Terra.
Mas uma das histórias mais fantásticas da vida pós-presidência é de Theodore Roosevelt, que construiu o Canal do Panamá. Depois de deixar a Casa Branca, fez sucesso escrevendo livros e aventurou-se numa expedição à Amazônia onde descobriu um rio chamado de, coincidentemente, Roosevelt. Tentou eleger-se novamente, era o candidato favorito, mas morreu pouco antes da eleição. Uma história parecida comum caso de um recente presidente brasileiro que iria inaugurar um novo período democrático no País.