segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Onda verde aquece negócios de Al Gore

Prêmio Nobel da Paz de 2007 e “ex-futuro-presidente dos Estados Unidos”, como chama a si mesmo, o democrata Al Gore enterrou de vez esta semana os sonhos dos fãs que esperavam sua candidatura à sucessão de George W. Bush: será sócio de uma das maiores empresas de capital de risco do mundo, a Kleiner Perkins Caufield & Byers (KPCB) que, após o advento da era da informação, agora investirá em negócios sustentáveis, especialmente na área de energia. O setor vislumbra um mercado potencial de US$ 6 trilhões nos próximos anos.
Como empresário – além de dono da Current TV, um canal a cabo para jovens, faz parte dos conselhos da Apple e da Google e ainda ganha dinheiro com livros e o documentário Verdade Inconveniente, ganhador do Oscar - Gore já é milionário (cobra US$ 100 mil por palestra) e poderia se aposentar na sua mansão em Nashville, Tennessee. Mas agora, diante da urgência de um desastre planetário com a elevação da temperatura, já existe o consenso de que quem vai salvar a Terra é a iniciativa privada, muito mais do que governos e tratados internacionais.
“Trata-se da combinação do Plano Marshall e dos Projetos Manhattan e Apolo ao mesmo tempo”, comparou o ex-vice-presidente que hoje, segundo pesquisas, é a personalidade mais popular nos Estados Unidos. Há três anos Gore fundou um fundo de investimentos sustentáveis, o
Generation Investment Management, mas agora virou sócio de uma empresa referência na Sand Hill, a rua do Vale do Silício que é o coração do venture capitalism no mundo. Seu papel será uma espécie de radar para novos negócios no setor.
A KPCB está para o capitalismo de risco assim como Steve Jobs, da Apple, está para o computador pessoal. Foi de lá que saíram investimentos iniciais para empresas como Google, Amazon, Sun e Netscape. Até 2009 a firma investirá pelo menos US$ 600 milhões em negócios que produzam tecnologias que reduzam a emissão de dióxido de carbono. Desde o ano passado foram investidos US$ 270 milhões em 26 empresas que fazem desde micróbios que destroem manchas de óleo até carros elétricos. 12 dos seus 22 sócios gastam a maioria do tempo em projetos “verdes”. “Estamos no início de uma nova revolução industrial, e significativamente maior e mais rápida”, disse Gore.
Na onda de Gore e seus sócios, grandes empresas americanas estão mergulhando no mundo da sustentabilidade. O Wal Mart, por exemplo, a maior empresa do mundo, acaba de fazer um evento para os seus 65 mil fornecedores em Bentonville, Arkansas, anunciando a construção de lojas ecológicas e, melhor ainda, redução no empacotamento de produtos. A Coca Cola já está investindo na substituição de seus nove milhões de refrigeradores e vending machines para reduzir e emissão de dióxido de carbono.
Embalado nesta virada da América Corporativa, Al Gore poderá, na iniciativa privada, realizar sonhos que talvez não pudesse realizar caso fosse presidente dos Estados Unidos. O também ex-senador e deputado federal é formado por Harvard em Letras, foi correspondente de guerra (embora se opusesse ao conflito do Vietnã, foi convocado e serviu como fotógrafo de uma revista especializada, Army Flier) e é uma espécie de reserva moral dos Estados Unidos.


. Acima de qualquer suspeita

Políticos são cobrados por roubalheiras ou escândalos sexuais, mas Al Gore, 59 anos, é questionado por coisas aparentemente inofensivas, com o rastro de carbono que provoca quando viaja de avião ou quando liga as luzes de sua mansão de US$ 2,3 milhões.
Para se defender, e não deixar nenhuma dúvida quanto aos seus propósitos, Gore paga pelo carbono emitido pelos aviões que utiliza através de websites como o
http://www.terrapass.com/. Acaba de instalar 30 painéis solares na sua casa e só utiliza carros híbridos como Prius, da Toyota.
Depois de um dos maiores revezes políticos da história, perder a eleição de 2000 para George W. Bush no Colégio Eleitoral mas ganhar no voto popular, Gore é o centro de uma revolução empresarial sem precedentes. Seu poder de mobilizar recursos políticos e financeiros para as chamadas empresas-verdes é inigualável no cenário de negócios nos Estados Unidos.
Na Kleiner Perkins Caufield & Byers, ele vai trabalhar pelo menos cinco dias por mês – até já comprou um apartamento em San Francisco, perto da sede da empresa – e vai dividir com os outros 22 sócios uma taxa de 2% de administração e cerca de 20% do dinheiro ganho com a venda ou abertura de capital das novas empresas de tecnologias limpas, como são chamadas.
Ao contrário dos investimentos na tecnologia da informação, até agora pouca gente ganhou dinheiro com empreendimentos que fazem painéis solares, aproveitam a energia das marés ou do hidrogênio a preços competitivos. Mas, com o petróleo beirando a US$ 100 o barril e o governo dando incentivos com programas e redução de impostos, a nova corrida do ouro já está em marcha.
Gore, até a década de 80 um político interiorano sem expressão nacional, transformou-se quando quase perdeu seu filho, Al Gore III, então com seis anos, num desastre de carro em 1989 em Baltimore, Maryland. Durante o longo período de restabelecimento, Gore escolheu ficar no hospital ao lado do filho, deixando em segundo plano da candidatura à presidência dos Estados Unidos em 1992.
Foi neste tempo que escreveu o livro “Terra em Equilibro”, uma reflexão que o levaria a tornar-se, uma década depois, um fenômeno respeitado internacionalmente. Ele fala sobre o assunto no documentário Verdade Inconveniente, ganhador do Oscar de Melhor Documentário em 2006, mas segundo os críticos “a mais famosa apresentação em PowerPoint da história”.
Seu filho foi preso em julho deste ano por posse de maconha e barbitúricos em Laguna Hills , na Califórnia, depois de atingir 100 milhas por hora em seu Toyota Prius. A imprensa americana correu atrás de Gore pedindo entrevistas. Ele atendeu a todos dizendo que se tratava de uma questão privada e, como tal, não falaria sobre o assunto.

Microtendências, ou Deus está nos detalhes

Você sabia que, cada vez mais, jovens norte-americanos estão fazendo crochê? Que o judaísmo é a religião mais querida aqui? Que está havendo uma explosão de nascimento de pessoas canhotas? Que a população de solteironas nos Estados Unidos quase dobrou de 1970 a 2005? Que existem cerca de 30 milhões de pessoas tatuadas? Ou que um milhão de homens norte-americanos fizeram operação plástica em 2006? É um punhado de informação (ou cultura inútil) que a gente vê aqui e ali, e que até hoje não sabia que se tratava de uma microtendência, um termo inventado recentemente que está dando o que falar nos Estados Unidos.
Tudo começou quando o especialista em pesquisas Mark J. Penn, hoje CEO da Burson-Marsteller, uma das maiores empresas de relações públicas do mundo, trabalhava para o então presidente Bill Clinton na Casa Branca, em 1996. Ele começou a perceber um fenômeno: mulheres brancas, casadas, moradoras dos afluentes subúrbios norte-americanos, devotadas aos filhos, estavam se tornando, muito mais do que os maridos, uma força política expressiva. Um detalhe que passava desapercebido nas pesquisas.
Penn as apelidou de “soccer moms”, não no sentido literal de mães de futebol, mas aquele tipo de mulher atribulada que leva os filhos de atividade em atividade, em carrões espaçosos, e que até então, pensava-se, estavam indefinidas politicamente. Clinton entendeu a mensagem, levou o assunto a sério e prometeu medidas que lhes agradavam, como coibir o tabaco entre os adolescentes, obrigar escolas a fazer testes de detecção de drogas e leis que limitam a violência na TV. Acabou se reelegendo com a ajuda delas.
Penn escreveu um livro sobre estes pequenos e intensos grupos que têm suas próprias necessidades e raramente aparecem no radar de marqueteiros, varejistas, publicitários, jornalistas ou quem quer influenciar os hábitos da sociedade. Junto com E. Kinney Zalesne, que também serviu na Casa Branca, lançou Microtendências –As Pequenas Forças por Detrás das Grandes Mudanças do Amanhã –, que não sai da lista dos mais vendidos do The New York Times desde setembro.
O livro reúne 75 microtendências em assuntos tão díspares quando amor, trabalho, religião, saúde, vida familiar, política, dinheiro, educação, lazer, moda e dietas. São coisas que gente, por assim dizer, não sabia que sabia. Por exemplo, que embora nasçam mais meninos que meninas, há falta de homem no mundo. Adolescentes machos morrem mais do que adolescentes fêmeas, enquanto que a população de gays homens é o dobro de mulheres lésbicas, pelo menos nos Estados Unidos. Ou que está explodindo o número de aposentados que, por terem uma vida mais longa ou por não gostarem de ficar em casa, continuam trabalhando. Ou ainda que está aumentando o número de pais-avós, que têm filhos depois de fazer o 55º aniversário.
A conclusão é que hoje em dia o mundo não age monoliticamente, mas é uma coleção de pequenos pontos que precisam ser juntados, e examinados, um a um. O mundo virou um grande Starbucks, onde cada um dos milhões de clientes que entra em suas 13 mil lojas é tratado pelo nome e pode escolher uma das 11.735 mil variedades de café, chá ou outra bebida qualquer. Cada um é cada um ou, como se diz, cada caso é um caso. Deus está nos detalhes.