segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O império da lei nos salva da selvageria


Atlanta - Hitlers, Osama Bin Ladens, Sadam Husseins, ou este menino que matou a namorada "por amor" no Brasil, todos eles merecem julgamento, defesa e advogado. Os "bad guys", como se diz aqui, vêm e voltam com o tempo, mas esta questão é eterna. Quando assistimos na TV crimes dantescos, nossa primeira reação é devolver aos criminosos todo o sofrimento que eles perpetraram. Torturá-los, humilhá-los, jogá-los à fúria de outras bestas feras na prisão. A vontade é: roubem-lhe os direitos, já que eles, como animais na savana, tiraram-nos a vida, a dignidade, um parente ou até bens materiais.
O advogado norte-americano Peter Keane vem defendendo criminosos há mais de 30 anos e, sempre, entre uma sentença e outra, depara-se com esta questão ética e moral. Em sua carreira profissional, frequentemente enfrenta a sanha do Estado, dos policiais, da opinião pública, da mídia e tudo mais. É o reú e ele, sozinhos num canto do Júri, contra o mundo. "Já ajudei a colocar em liberdade gente que, livre, matou mais pessoas", testemunhou no programa I Believe, da NPR , a rádio pública norte-americana. "E isto, é claro, trouxe noites em claro, ansiedade e depressão".
A maioria das pessoas tem dificuldade em entender tudo isto, diz Keane. O direito à defesa, por incrível que pareça, explica, é o mecanismo que a nossa sociedade inventou para proteger e manter a nossa liberdade. Se sempre nos pautarmos pela regra de que, não importa o que um indivíduo tenha feito, sempre haverá uma pessoa para defendê-lo, seremos livres também. A regra, sábia, simples e extremamente eficiente, é um antítodo contra a tendência natural de ser humano de agir sob a influência da emoção ou, o pior, abusar do poder, de qualquer poder.
Embora defendesse cada um dos seus clientes com habilidade, tenacidade e criatividade, a maioria deles foi condenada. Outros, mesmo culpados, foram postos em liberdade e voltaram a cometer crimes. Keane voltou a defendê-los com o mesmo zelo.
Como ele se sente depois de três décadas defendendo criminosos? Orgulhoso. Sua consciência ainda se debate com este diálogo moral? Sem dúvida.
Nos júris, ele conviveu não só com os criminosos, mas muitas vezes com as vidas - destroçadas, humilhadas, corroídas - de familiares e amigos das vítimas. Mas, ao final de cada julgamento, a crença de que ele estava fazendo, mais uma vez, a coisa certa, prevalecia sobre uma possível dor de consciência.
"Tirar esta proteção para quem cometeu o crime, ou de quem foi acusado de cometer um crime, joga por água abaixo todos os outros direitos democráticos, que foram tão cuidadosamente refinados durante o nosso processo civilizatório. Sem a resistência dos advogados que representam pessoas processadas, toda a liberdade se perde", diz ele.
Hoje dando aulas em universidades, Keane recomenda a seus alunos manterem o orgulho de defender os criminosos, não importa o que eles ou elas fizeram. "Eu desejo que eles saibam defender gente como Saddam Hussein e Osama Bin Laden, ou para os estupradores, assassinos e ladrões. Uma pessoa do seu lado, não importa o que você fez. É nisto que Keane acredita.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

O Youtube é que ganhou as eleições nos Estados Unidos

Seattle - As eleições de 2008 têm um grande vencedor. É o Youtube, o site controlado pelo Google que, hoje, é a maior ferramenta de panfletagem (e de reflexão) política em todo o mundo. Acredita-se que, dos 200 mil vídeos postados todos os dias, cerca de 35% sejam de cunho político, disponíveis 24 por dia, 365 dias por ano. Juntos, os vídeos que envolvem Barack Obama e John McCain já receberam cerca de 100 milhões de visitas. A maioria deles são curtos e extremamente bem produzidos, parecidos com comerciais, geralmente feitos pelas campanhas por cima ou por debaixo do pano. O vídeo de maior sucesso, no entanto, é o que ridiculariza a candidata Sarah Palin, candidata à vice-presidente pelo Partido Republicano, especialmente as engraçadíssimas caricaturas feitas no programa Saturday Night Live, da NBC. Do lado de Obama, possivelmente o futuro presidente dos Estados Unidos, o mais assistido é o seu já famoso discurso sobre a questão do racismo, um catatau de 37 minutos já visto 6 milhões de vezes.

Por que este sucesso todo? Em primeiro lugar, segundo o Politico.com, o site vem roubando audiência da TV da mesma forma que a TV roubou os públicos das rádios e jornais desde a campanha do republicano e herói de guerra Dwight Eisenhower em 1960. Aliás, tudo que a TV produziu em seu 60 anos de história é o equivalente a apenas seis meses de Youtube. Só em julho último, segundo uma pesquisa da Universidade do Kansas, aproximadamente 91 milhões de internautas assistiram a 5 bilhoes de vídeos no site. Em segundo, o Youtube está mais presente na política do que promessa de candidato. O Pew Research Center diz que 35 milhões de americanos já assistiram vídeos on line relacionados com política. Num país de quase 400 milhões de habitantes, nunca houve tanta gente politizada e, melhor ainda, com vontade de colaborar.

Em terceiro lugar, o Youtube é uma fantástica ferramenta política. Candidatos e simpatizantes colocam milhares de vídeos todos os dias, mesmo antes de acabar os eventos, na tentativa de chamar a atenção do eleitorado, sem interferência de um jornalista metidinho qualquer que descontextualize a mensagem do candidato. E, para o bem ou para o mal, o vídeo fica ali para sempre, virando fonte de referência caso você tenha perdido a ocasião. Dependendo do tanto de gente que os assiste, as campanhas têm à mão a resposta imediata do eleitorado, também para o bem ou para o mal. Quem perde são as empresas de pesquisa.

O Youtube é a estrela da Web 2.0, uma revolução colaborativa na Internet que está mudando o mundo, com importantes reflexos na política. Ao lado deste site, Facebook, Twitter, MySpace (e até o Orkut no Brasil) são ferramentas de um fenômeno muito maior que ultrapassa os conceitos políticos tal qual os conhecemos. O povo, ou os internautas, não querem mais apenas votar. Querem participar do processo político, também terem seus 15 minutos de fama, mudar o mundo através das teclas do computador. Fora Barack Obama, poucos políticos perceberam que a Web 2.0 está mudando mundo. Em 2008 estamos vendo apenas uma gota de um oceano que, em breve, vai mudar (para o bem) como lidamos com o mais importante ato de nossas vidas: o voto.