O dono da "Hustler", a mais pornográfica de todas as revistas pornográficas, Larry Flynt, responde que todos nós não passamos de seres humanos e, portanto, estamos sujeitos a uma tal de monoamina oxidase tipo A (irma), enzima que regula neurotransmissores como a dopamina. Quanto menor o nível de irma no corpo dos políticos, ou de qualquer outro poderoso, maior a disposição para correr riscos excitantes, que os libertem do cotidiano e da chatice das suas vidas pessoais.
Flynt, autor do recente best seller "One Nation Under Sex" (ou como a vida privada de presidentes, primeiras damas e seus amantes comanda a história dos Estados Unidos), paraplégico depois de levar um tiro de um supremacista, percorre os Estados Unidos como um paladino da defesa da Primeira Emenda à Constituição, que garante o direito de expressão a todos os cidadãos, seja lá qual for a mensagem ou o mensageiro.
Neste "road-show", Flynt aproveita para denunciar a "hipocrisia" que, a cada seis meses, segundo suas contas, invade os lares do país com um assunto que leva os americanos ao orgasmo coletivo: sexo na mídia, de preferência 24 horas por dia, sete dias por semana.
A novela de escândalos sexuais percorre toda a história do país, chegando agora a Schwarzenegger e Strauss-Kahn
A novela de escândalos sexuais percorre toda a bicentenária história do país. Tentativas de estupro, filhos bastardos, namoros fortuitos, lesbianismo, videoteipes, escutas, sexo selvagem (em todas as posições e condições) e, mais recentemente, ataques a camareiras e babás acontecem repetidamente, de Thomas Jefferson a Barack Obama, atingindo agora o ex-governador da Califórnia e o também agora ex-diretor geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn.
Schwarzenegger, segundo Flynt, jamais será perdoado pelos americanos, como foi o ex-presidente Bill Clinton, "um homem que fez pelo sexo mais do que todos os outros presidentes reunidos". Já Strauss-Kahn teve o azar de dar vazão à sua volúpia em solo americano. Fosse na França, onde o ex-presidente François Miterrand tinha múltiplas amantes (uma até chorou junto à viúva no funeral), o caso da camareira teria passado despercebido, diz Flynt.
No livro, um catatau de 300 páginas que escreveu em coautoria com David Eisenbach, Flynt conta em detalhes a performance dos presidentes e de suas mulheres, cada um em seu canto, à sua hora e ao seu estilo, e argumenta que sexo é a mais avassaladora arma da política. Depois que a Guerra Fria acabou, dizem os autores, foi criado o inimigo número 1 da moral e dos bons costumes: o pulo do muro, a merenda antes do recreio, ou simplesmente o desejo (muitas vezes consumado) pela mulher (ou o homem) do próximo.
Essa fixação em sexo, segundo Flynt, é a melhor e mais eficiente forma de entreter o público e, mais que tudo, de desviar a atenção dos problemas que o país enfrenta. "Está na hora de deixarmos nosso moralismo político e focalizarmos os problemas reais que ameaçam nossa nação", adverte.
Nas aparições públicas, Flynt anda de cadeira de rodas de ouro maciço, pinta o cabelo, veste-se impecavelmente e fala com dificuldade. Teve um derrame decorrente dos efeitos colaterais dos remédios que toma para amainar dores. Deixa o coautor David Eisenbach, que é gay e já escreveu um livro sobre homossexualismo e poder, falar quase o tempo todo nas entrevistas coletivas sobre as orgias na Casa Branca e em outras sedes governamentais. Só não abre mão quando o assunto é Clinton, "meu favorito", segundo ele.
Na época da estagiária Monica Lewinsky, que quase culminou com o impeachment do presidente, Flynt ofereceu US$ 1 milhão para quem denunciasse qualquer congressista que também tivesse ciscado na horta alheia. Acabou sendo uma peça decisiva na salvação do presidente, quando começaram a pipocar casos no Capitólio. Clinton deixou a Casa Branca aplaudido, com 68% de aprovação, ao passo que os republicanos, inclusive Newt Gingrich, hoje pré-candidato a presidente, ainda lutam para se livrar do porão da história.
Flynt e Eisenbach revelam que foi Monica Lewinsky quem começou a seduzir o presidente. Levantou parte do seu terninho azul para se mostrar a sua excelência na chamada Ala Oeste da Casa Branca. Duas noites depois, já fazia sexo oral com Clinton no Salão Oval, mesmo quando o presidente falava com congressistas ao telefone e usava charutos como acessório sexual. O romance duraria um ano e meio e só teria sido presenciado pelo serviço secreto.
As depressões de Abraham Lincoln são associadas à sua infelicidade no casamento depois de dormir na mesma cama com um amigo
O turbilhão que se seguiu à descoberta do caso acuou Clinton, que já naquela época tentava acabar com um terrorista chamado Osama bin Laden, destruir um grupo radical (Al Qaeda) e aprovar um novo plano de saúde para os americanos. O escândalo em que o presidente se meteu tirou-lhe das mãos a oportunidade de mudar a história, como faria Barack Obama quase duas décadas depois.
Clinton não era uma máquina sexual como John F. Kennedy, que tinha enxaquecas noturnas caso lhe faltasse sexo com alguma mulher, não só a primeira dama. Mas, segundo relato de Jennifer Flowers e Paula Jones, outras vítimas da sua volúpia, era fenomenal na arte de satisfazer suas parceiras. "Foram apenas sete minutos, mas os sete minutos mais intensos de minha vida", relembra Jennifer.
O mundo se acostumou a ver primeiras damas resignadas com os orgias de seus maridos, como Hillary Clinton postando-se ao lado de Bill Clinton e acusando "a conspiração da direita" para destruí-lo com falsas acusações. Mas nem todo mundo foi como Hillary.
Jackie Kennedy, que perguntava elegantemente ao marido de quem era aquela lingerie que estava debaixo do travesseiro, "pois esta não é do meu tamanho", era filha de pais separados e, segundo Flynt, jamais suportaria a dor de ser humilhada em público pelas traições do marido, mesmo depois de infectada com chlamydia, que lhe provocou abortos. Por vingança, teve relações com outros parceiros mesmo depois de seu casamento com John, seja em estrebarias, com o ator William Holden, no iate Chiristina com o magnata grego Aristóteles Onassis, com o ex-presidente da Fiat Gianni Agnelli, em Ravelo, Itália, e com o seu cunhado Robert Kennedy - tórrido romance que só terminou quando ele morreu com dois tiros na cabeça, num hotel em Los Angeles. Diz Flynt que, caso o presidente Kennedy não tivesse sido assassinado em Dallas, a Casa Branca assistiria ao primeiro divórcio da história antes da eleição de 1964.
Outra ativa militante dos leitos ex-conjugais foi Eleanor Roosevelt, que, desiludida com as abertas traições do marido Franklin, enamorou-se da jornalista Lorena Hickok, do "The New York Times" e depois da Associated Press, a primeira jornalista a assinar uma manchete de primeira página. O amor foi tão forte que Eleanor convidou-a a morar na Casa Branca, num quartinho contíguo ao seu. O romance lésbico durou até a morte de Eleanor, em 1962, e mudou radicalmente a vida da primeira dama, que, a partir de então, tornou-se militante dos direitos sociais. Por influência da amante, promoveu 348 entrevistas coletivas durante os 12 anos da Presidência do marido, escreveu 8 mil artigos na coluna "My Day" e é considerada uma das pessoas mais admiradas do século XX. A adversidade conjugal e o amor gay, por si só revolucionário para a época, transformaram-na numa heroína.
A preferência pelo mesmo sexo perseguiu o 16º presidente americano, Abraham Lincoln, o homem que acabou com a escravidão e reunificou o país depois da Guerra da Secessão. Suas intensas depressões são associadas à infelicidade do casamento tardio com Mary Todd, depois de morar e dormir na mesma cama com o amigo Joshua Speed em Springfield, Illinois. Flynt lembra que outro grande amor da vida de Lincoln foi o capitão David Derickson, do 150º regimento, a uma milha da Casa Branca. Lincoln adorava matar o tempo com os soldados e acabou convidando o capitão para acompanhá-lo como guarda-costas, cocheiro e, na ausência da primeira dama, cobertor.
Mas foi a partir da década de 1970, com mídia perdendo o pudor e revelando casos que anteriormente eram reservados aos mexericos, que a coisa pegou fogo. Depois de Clinton, o governador de Nova Jersey, Jim McGreevey, revelou que era gay e renunciou ao cargo em 2004. Dois anos depois, o republicano Mark Foley, combatente defensor das crianças, foi pego mandando textos sobre masturbação para estagiários adolescentes do seu gabinete. Em 2007, o senador Larry Craig, de Idaho, foi preso depois de tentar fazer sexo num banheiro público do aeroporto. Em 2008, o governador Elliot Spitzer abandonou o governo de Nova York depois de ter relações sexuais com uma prostituta em Nova York sob o pseudônimo de "Cliente Número 9" (aliás, a cafetina era brasileira). Em 2009, o governador da Carolina do Sul, Mark Sanford, desapareceu por uns dias e revelou que estava nos braços de uma amante, na Argentina. E há o caso do candidato democrata à Presidência, John Edwards, que engravidou uma cinegrafista durante a campanha eleitoral, enquanto sua mulher estava com câncer.
Para Larry Flynt, o que acontece na vida privada dos políticos não diz respeito a ninguém, desde que o sexo seja consensual. Só falta, segundo ele, os americanos perceberem que são cidadãos de uma nação como todas as outras, onde o sexo existe, é prazeroso e, enquanto existir, também existiremos. A outra opção é ser como Jimmy Carter, o 39º presidente americano, considerado por Flynt o único santo que ocupou a Casa Branca. Carter uma vez declarou que traiu sua mulher, mas só em pensamento.
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