segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Rudy Giuliani, a próxima vítima

Amanhã, quando forem abertas as urnas das eleições primárias da Flórida - um estado que até hoje está com a barra suja por ter dado a vitória a George W. Bush há sete anos - o ex-prefeito de Nova York Rudolph William Louis "Rudy" Giuliani estará com o coração na mão.
O ex-manda-chuva da maior cidade americana, que montou a estratégia para tornar-se o candidato republicano em 2008 em cima das cinzas do ataque terrorista de 11 de setembro, jogou boa parte do dinheiro de campanha, em torno de 47 milhões de dólares, no estado favorito dos brasileiros, onde floresce Miami, a capital da América Latina.
Por que Giuliani, um ex-promotor público sobrevivente a um câncer de próstata e especializado em prender mafiosos na fria Nova York, deixou de investir em Iowa, New Hampshire ou na Carolina do Sul para ganhar os votos republicanos num estado tropical, sulista e cheio de imigrantes ilegais?
Por uma simples razão: a Flórida é onde boa parte dos endinheirados nova-iorquinos vai se aposentar. Aos 64 anos, e sempre martelando a necessidade de ter um líder experiente para enfrentar crises, o que soa como mel no mamão para os idosos, Giuliani acredita que irá fazer sucesso lá.
Ledo engano. As últimas pesquisas lhe dão um humilde terceiro lugar nas preferências dos republicanos na Flórida, atrás de John Mccain, o senador por Arizona torturado durante cinco anos no Vietnã, e Mitt Romney, o empresário mórmon que salvou as Olimpíadas de Salt Lake City do fracasso e tem 250 milhões de dólares no bolso.
Saltar algumas primárias é uma prática comum entre os candidatos presidenciais norte-americanos, mas Giuliani comete três erros que, provavelmente, e se nenhum fato novo acontecer (e como acontece...) vão enterrá-lo politicamente.
Tirar proveito da desgraça. Giuliani tornou-se o homem do ano de 2001 depois que, no apagar das luzes como prefeito de Nova York, liderou o atendimento de milhares de vítimas do ataque terrorista às Torres Gêmeas. Mas agora, depois de quase sete anos do ocorrido, o que muitos norte-americanos querem é esquecer as imagens mais tristes que o país registrou em dois séculos de existência. Ficar lembrando os aviões espatifando-se nos arranha céus não é muito atrativo para o eleitorado.
Nova York, afinal, não é os Estados Unidos. A cidade de 19 milhões de habitantes, considerada a capital do mundo, não reflete nem de longe a realidade norte-americana. É como tomar o pulso do eleitorado brasileiro pelos cariocas. Tabus como homossexualidade, divórcio, aborto e drogas são vistos como uma certa complacência pelos nova-iorquinos. Basta dar uma volta em Times Square.
Republicanos são conservadores. Não adianta Giuliani ser republicano de carteirinha quando casou três vezes, foi morar com um casal gay quando se divorciou a última vez e é tão liberal em relação ao aborto como uma feminista democrata. A onda conservadora nos Estados Unidos, agora que o país está se derretendo economicamente, continua firme e forte.
Como se não bastasse, ainda existe um fantasma que povoa os sonhos de Giuliani. Vira e mexe, seu sucessor como prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, é citado para concorrer à presidência dos Estados Unidos como candidato independente. A política, seja em qualquer lugar, é uma atividade traiçoeira, mas está sendo impiedosa com Rudy
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segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Homem não chora, mulher pode?

Depois de levar a primeira surra de sua vida, chegando em terceiro lugar no caucus de Iowa, a senadora Hillary Rodham Clinton, 60 anos, reuniu outras madames num café em New Hampshire e, entre cappuccinos e croissants, assustou a audiência quando, com voz embargada, quase chorou. De mulher para mulher, e de frente para as câmeras, desabou diante do cansaço, da pressão e da solidão da agitada campanha presidencial norte-americana.
Não deu outra. A esposa de Bill Clinton, favorita nacionalmente, mas ainda rejeitada por metade dos americanos, mostrou seu lado mulher (coisa que se recusava a fazer na campanha) e, assim, reverteu o quadro, qanhando de virada as primárias do Estado, à frente dos outros democratas Barack Obama e John Edwards. O choro ganhou um editorial no The New York Times assinado pela feminista Gloria Steinem.
Até hoje, depois de mais de dois séculos de independência, nenhuma mulher chegou perto de ocupar o Salão Oval da Casa Branca. A cadeira de presidente, como todos sabem, é quente: dá dores de cabeça, noites mal dormidas, pressões de todos os lados e muitas rugas. Repare nas fotos dos presidentes no decorrer dos mandatos. O tempo não faz bem a eles.
Hillary, se chegar lá, vai ter de provar que uma mulher sabe governar os Estados Unidos, pois, como diz Steinem, aqui o racismo de gênero sexual é maior do que o racial. Ou seja, terá de ser um boa presidente, “apesar de ser mulher”.
Hillary (ou qualquer outro candidato) vai encontrar um governo decadente, as finanças em frangalhos, uma guerra impopular e um partido Democrata dividido, embora (ainda) tenha maioria no Congresso. Vai ter que capturar Osama Bin Laden, fazer o papel de xerife do mundo, viver sob proteção do serviço secreto 24 horas por dia e, mesmo assim, estar bem vestida, maquiada e com o cabelo armado.
Ter receio de uma presidente mulher soa estranho num país onde as mulheres simplesmente mandam. Independentes, já são maioria da força de trabalho, ganham mais do que os homens, invadem as universidades e têm vida econômica própria, sem ter que depender de qualquer outra figura masculina.
Mas o fato é que os Estados Unidos (e a maioria dos países) nunca tiveram uma presidente mulher. Ao ver Hillary à beira de um ataque de nervos na TV, os americanos temeram que, ante outros aborrecimentos (e como presidentes os têm), qual seria sua reação? Reagir? Acomodar-se? Rir? Chorar? Afinal, diz Freud, o que se passa na cabeça de uma mulher?
Hillary ainda tem 48 Estados (onde serão realizadas primárias) para testar suas emoções. Ela tem o maior caixa de campanha (quase US$ 100 milhões), uma estrutura espetacularmente profissional, o apoio do chamado establishment, a força dos eleitores de Nova York, onde já é senadora por dois mandatos, e o ombro do melhor e maior cabo eleitoral que se pode ter, o ex-presidente Bill Clinton, popular e querido não só nos Estados Unidos como em praticamente em todo o mundo.
Hillary é inteligente, rica, bem sucedida como advogada, experiente na Casa Branca, onde passou oito anos ao lado do marido, um potencial de abrir uma nova frente para as mulheres a partir de seu exemplo e, como escreveu Gloria Steinem, ainda leva uma vantagem: não precisará provar sua masculinidade. E poderá, se quiser, chorar.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O incrível "Dr. Não", sempre candidato

O fenômeno do Dr. Não, como é mais conhecido Ronald Ernest "Ron" Paul, um médico republicano do Texas, está desafiando os jornalistas, os assessores políticos e, principalmente, seus concorrentes à Presidência dos Estados Unidos. Cara de bonachão, o cordato velhinho (parece bem mais idoso que seus 72 anos) é um tremendo sucesso na Internet, graças a um bando de infomaníacos que, 24 horas por dia, sete dias por semana, faz parte do chamado marketing virtual: infiltram-se em blogs, enviam vídeos para o YouTube e disseminam spans pela rede. Resultado: semana passada, e pela segunda vez nesta campanha, Paul arrecadou quase 10 milhões de dólares em um só dia. Um recorde em toda a história política norte-americana.
A exemplo das cabeças dos juízes, ninguém sabe ao certo o que sai da mente do obstetra que participou da Guerra do Vietnã. Libertário, segue o mantra “você é o dono do seu próprio nariz”, mas, inexplicavelmente, é contra o aborto. Também é contra qualquer tipo de guerra, controle de armas e o aumento de impostos. Aliás, quer acabar com o imposto de renda e, de quebra, com o próprio Banco Central norte-americano, pois acha que os países, assim como as pessoas, devem viver dentro das suas possibilidades, e não “rodar a maquininha” de fazer dinheiro ou endividar-se no cartão de crédito, como boa parte da população faz. Não intervencionista, quer que os soldados americanos voltem para casa e que os Estados Unidos utilizem forças especiais, como a CIA, para combater seus inimigos. Ou seja, um samba do crioulo doido.
O incrível, no entanto, é que Ron Paul aparece em primeiro lugar na preferência do eleitorado em várias pesquisas de araque, principalmente aquelas realizadas entre os internautas. Lidera, por exemplo, o ranking de palavras-chave nos mecanismos de busca da Internet, liderança que pode ser espontânea, como Paris Hilton ou George Bush, ou forçada, que geralmente é resultado de manipulações técnicas de gente especializada no assunto. Como disse a rede ABC, “os simpatizantes de Ron Paul tem um grande habilidade na arte do marketing viral, usando especialistas e postagens de blogs para criar uma percepção de momento de sua candidatura. O USAToday, o jornal de maior circulação dos Estados Unidos, concluiu: “Ele é naturalmente on line, porque, entre outras razoes, libertários amam da rede mundial de computadores”. O problema, no entanto, é que nas pesquisas reais, feitas por gente profissional com parâmetros profissionais, Ron Paul aparece nos últimos lugares, perdendo feio para gente como Rudy Giuliani, o ex-prefeito de Nova York, o ex-governador de Massachusetts, Mitt Romney, e até para o ator grandalhão de voz cavernosa Fred Thompson.
Ron Paul já está em seu terceiro mandato no Congresso norte-americano e, vez por outra, arrisca-se com uma candidatura à Presidência. Já poderia ter se aposentado na companhia dos cinco filhos, 18 netos e um bisneto. No entanto, a paixão política o leva a candidatar-se mais uma vez, mostrar idéias estranhas ao eleitorado (coisas que, na Presidência, jamais faria) e, principalmente, fazer sucesso entre os eleitores virtuais.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Greenspan, biografia é o livro do ano

A correspondente da rede NBC em Washington, Andrea Mitchell, só percebeu que o sisudo Alan Greenspan estava lhe pedindo em casamento na terceira tentativa. O então presidente do Federal Reserve, o Banco Central norte-americano, o homem que com apenas uma ferramenta – a taxa de juros – governou os Estados Unidos (e por tabela o mundo) durante duas décadas, falava por hipérboles, metáforas e analogias difíceis de decifrar, um hábito dos tempos em que dava recados aos mercados sem deixá-los em pânico ou, como gostava de comparar, mandava cortar a bebida alcoólica quando a festa começava a esquentar.
Andrea se casou com Alan e foram felizes para sempre. A esposa está sempre presente em sua autobiografia, um catatau de 520 páginas chamado “A Era da Turbulência – Aventuras Em Um Novo Mundo –, que pode ser considerado o livro do ano de 2007 por uma razão: é um dos melhores livros de história escritos até hoje. Sob a batuta deste maestro, que com uma incrível capacidade de sobrevivência atravessou os governos Ford, Carter, Reagan, Bush, Clinton e Bush filho, o mundo assistiu a choques de petróleo, à queda do Muro de Berlim, ao fenômeno da Internet, a sucessivas falências de países (inclusive o Brasil) e, finalmente, ao ataque terrorista aos Estados Unidos em Setembro de 2001.
O judeu nova-iorquino nascido em 1926 em Manhattan, cuja vocação inicial era ser saxofonista na banda de Glenn Miller, é nada mais que um amante de dados, planilhas, tabelas, relatórios ou tudo que contenha números. Tira as conclusões, de preferência, dentro da banheira, todos os dias de madrugada, o que provoca a ira dos assessores que lêem seus manuscritos borrados. Sua conclusão mais famosa é o da “exuberância irracional”, uma advertência sobre a bolha de ações da Internet que começou no dia 9 de agosto de 1995, quando foram lançadas as ações da Netscape, deixando seus donos milionários, e explodiu na virada do século. Greenspan tem uma posição dúbia a respeito do fenômeno pontocom: ao mesmo tempo em que criticava a irracionalidade do mercado, creditava a resiliência da economia norte-americana aos ganhos de produtividade promovidos pela tecnologia – comunicações e computadores invadindo as empresas.
Este é aspecto mais interessante da biografia de Greenspan. Como pode a maior potência industrial e econômica do mundo, os Estados Unidos, exportar praticamente todos os empregos para a China e outros países de mão de obra barata e, assim mesmo, manter uma economia de pleno emprego? “Hoje”, escreve o economista que se tornou milionário fazendo previsões econômicas para a indústria siderúrgica na década de 50, “os americanos mudam de emprego em escala verdadeiramente estupenda”. E é mesmo. Numa força de trabalho de quase 150 milhões de pessoas, um milhão muda de emprego a cada semana – cerca de 600 mil por vontade própria, enquanto cerca de 400 mil são demitidos, quase sempre quando suas empresas são adquiridas ou reduzem o efetivo de pessoal. Ao mesmo tempo, um milhão de trabalhadores são contratados por outras empresas também a cada semana, à medida que se expandem os novos setores e se criam novos negócios.