terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Deixe o diretor do marketing morrer

Vamos poupá-lo de mais sofrimento, diz o recente editorial da Advertising Age. Nos Estados Unidos, como em todo o mundo, este cargo está se tornando uma cadeira quente. De um lado os acionistas estão contando centavos e exigindo explicação para qualquer despesa. Do outro, um mundo em revolução. Bem diferente do passado, ninguém sabe mais quem é o cliente, onde ele está e, se ele existe mesmo, como podemos acessá-lo pelo menor custo/benefício e, de preferência, “prá ontem”.
Se você é diretor de Marketing do Google, por exemplo, está com um emprego garantido: basta sentar e ouvir os elogios, enquanto recusa propostas dos publicitários para fazer “aquele anúncio de 30 segundos em rede nacional para vai mudar a sua vida”. Agora, se você é diretor de Marketing da maioria das empresas que não tem um produto ou serviço tão fantástico quanto o Google, está em maus lençóis. Sugere uma campanha da TV, enquanto o consumidor recebe notícias no celular. Faz planos para uma campanha virtual, quando o contato do consumidor com a mídia é o outdoor que ele vê quando vai para o trabalho.
Os papas do setor argumentam que marketing é um trabalho difícil, demorado, multifacetário, que precisa estar à frente de um produto ou serviço legal. É uma espécie de pedido de prazo até que o dono da empresa descubra que o esforço de marketing não deu certo. Raramente acontece o contrário. A pesquisa da Spencer Stuart, divulgada na Business Week, diz que os diretores de Marketing permanecem no cargo, em média, cerca de 26 semanas. Já os diretores de Informática (36) e de Finanças (39) ficam um pouco mais. O último a cair é o comandante do barco, o CEO, com apenas 44 semanas, ou apenas 11 meses.
Já se foi o tempo em que a diretoria de Marketing era um cargo reservado à filha do dono ou ao genro “que a gente não sabia aonde pôr”. Hoje, as empresas reconhecem sua importância, mas a tendência é que este cargo não esteja na mão de uma só pessoa, mas de todo o mundo. A idéia é que todos dividam esta responsabilidade, a começar pelo contínuo. Se você visitar o campus da Microsoft perto de Seattle, descobrirá que metade dos 60 mil funcionários está fazendo software, enquanto a outra metade marketing. No Google é a mesma coisa. E na Apple também. O resto é resto.
Para evitar o destino da maioria dos diretores de Marketing, a demissão, os marqueteiros agora estão propondo novas formas de sobrevivência nas empresas. Quando deixou a Toyota para ocupar o mesmo cargo na Ford, o CMO (chief marketing officer) James Farney descobriu que teria vida curta caso não vinculasse seus resultados com as vendas mensais, o parâmetro de sucesso da indústria automobilística. Propôs ao CEO Alan Mulally, que veio da Boeing, que ficasse responsável também pelas vendas do mercado mais problemático da Ford, os Estados Unidos. Assim, explicou, estaria na mesma panela de pressão dos colegas. Mulally aceitou e Farney manteve o emprego. Nas reuniões mensais de estratégia, não pode mais dourar a pílula com apresentações em power point ou recitar os mantras dos marqueteiros. O resultado do seu trabalho está ali, frente a frente com a realidade.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Nem sexo, nem drogas, sé rock and roll

O pastor batista Mike Huckabee, 51 anos, um “ex-viciado em comida” que perdeu 50 quilos em 60 dias e virou um menestrel das dietas, poderá ser o próximo presidente dos Estados Unidos. Ex-governador do Arkansas que nasceu na mesma cidade de Bill Clinton, Hope, Huckabee teve uma ascensão meteórica nas pesquisas de opinião nos últimos dias, batendo todos os outros candidatos à indicação do Partido Republicano para concorrer à presidência.
Os jornais atribuem a virada à religiosidade de Huckabee, o que cai como uma luva nos eleitores que, em matéria de política, preferem à Bíblia à Constituição. O homem é contra o aborto, o casamento homossexual e pesquisas com embriões humanos, embora não repita estes mantras da direita nos discursos e entrevistas. Ao contrário, ele parece um livro de auto-ajuda que se abre a cada questionamento dos eleitores ou dos jornalistas. Olhos nos olhos, voz firme, postura de vencedor, Huckabee prefere falar, por exemplo, do direito do cidadão em portar armas.
- A violência diminui quando o criminoso sabe que vai encontrar na próxima esquina um cidadão armado disposto a matá-lo, caso seja necessário, disparou ele outro dia.
Huckabee nunca fumou ou bebeu. Depois de ter sido diagnosticado com diabetes em 2003 e ter sido avisado por seus médicos de que morreria no máximo dentro de 10 anos, fez regime, correu maratonas como de Nova York e, ainda, elegeu o perigo da obesidade como tema de seus dois governos no Arkansas. Lá, traindo outro mantra republicano, elevou os impostos e é criticado até hoje por isto. Como o ex-presidente e conterrâneo Bill Clinton, que pensava tocar saxofone, ele arranha uma guitarra em concertos de rock and roll.
O ex-governador do Arkansas estava, até um mês atrás, na lanterna das pesquisas de opinião, o que o deixava à míngua na arrecadação de recursos para a campanha. Gastou só passagem de avião para conquistar eleitores de Iowa, o Estado que hospedará o cáucus no dia 3 de janeiro e que é a porta de entrada para medir a preferência do eleitorado. Lá, seu oponente mais próximo no Partido Republicano, Mitt Romney, o ex-governador de Massachusetts que é mórmon e milionário, já gastou mais de US$ 10 milhões do próprio bolso para ganhar a simpatia dos eleitores conservadores. Em termos nacionais, o ex-prefeito de Nova York, Rudy Giulianni, é o preferido dos Republicanos, enquanto Hillary Clinton ainda lidera entre os democratas.
Huckabee é pós-graduado no seminário batista, mas resolveu entrar para a política quando ouviu um discurso do pai de todos os republicanos, Ronald Reagan, em agosto de 1980, num estádio de Dallas, Texas, ao lado de 15 mil evangélicos. “Todas as complexas e horrendas questões que confrontamos hoje em casa e no mundo tem as respostas em um simples livro”, disse o cowboy. Ali, segundo Huckabee, estava a gênese de todo o movimento cristão e conservador. Que, há mais de 20 anos, invadiu a política nos Estados Unidos.
Por esta e por outras a eleição presidencial norte americana vem sendo considerada uma das mais interessantes e importantes da história recente. Com base nas atuais pesquisas de opinião, poderemos ter uma mulher, um negro ou um pastor na Casa Branca. Já pensou como será o mundo a partir daí?

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Já Escolheu o homem (ou a mulher) do ano?

Desde 1927, a história se repete: a revista Time, a mais influente do mundo, escolhe o homem (ou a mulher do ano). A tradição nasceu do acaso. Em 1927, como em todos os anos, havia falta de notícias entre o Natal e ano-novo. Parece que o mundo descansa nesta época. Sem assunto, e para remediar o fato de não terem colocado na capa o herói daquele ano, o aviador Charles Lindbergh, o primeiro homem a cruzar o Atlântico de teco-teco, a premiação começou.
Os editores da revista recusam-se a considerar a capa do Homem do Ano um prêmio. O perfil é do homem, ou mulher, ou casal, ou grupo, ou idéia, ou lugar, ou máquina que, para !mlehor ou pior modificou os eventos de determinado ano". Hilter ganhou em 1939, como você, isto mesmo, você, ganhou no ano passado por mudar o mundo através da internet. Há uns tempos, pode votar eletronicamente, mas quem dá a palavra final são os editores.
Em 2007, os candidatos são J.K Rowwling (primeiro lugar), autora do Harry Potter, seguida pelo Prêmio Nobel da Paz, Al Gore, o candidato negro a Presidência Brack Obama, a secretária de Estado Condoleeza Rice e o encrenqueiro Ahmadinejad, prediedente do Irã. Você ainda pode votas no site ww.time.com em Steve Jobs, da apple, no general David Petraeus (milagrosamente está diminuindo a violência no Iraque), Hillary Clinton (imbatível nas preferências dos democratas para suceder Bush), e Vladimir Putin, o manda-chuva da Rússia.
A capa do Homem do Ano parece um agradecimento da humanidade à pessoa que mudou odestno da Terra nos 365 dias anteriores. Ou nos últimos cem anos, como Albert Einstein, já escolhido como Homem do Século. Como tudo nos Estados Unidos, sempre foi motivo de controvérsia. A tendência é obter a simpatia do eleitor elegendo gente que faz o bem. Bin Laden mudou o mundo para pior foi desprezado em 2001. Contraditoriamente, o Ayatollah Khomeini, salvador para os islâmicos, foi eleito em 1979.
O evento tem seus demônios. Na votação via internet em 2006, Hugo Chavéz ganhou, seguido por Nacy Pelosi, a falante presidente do Congresso norte-americano. Para esquentar o debate, que tal votar em George W. Bush, que já ganhou em 2004? A teimosia do homem que, contra a vontade de 6 bilhões de habitantes da Terra, manteve (e mantém) uma guerra fraticida, impopular. Ele ainda não anunciou, mas tudo indica que o homem vai ganhar a Guerra no Iarque.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Obama e Huckabee viram a mesa

Virada na eleição presidencial norte-americana esta semana. Barack Obama, 46 anos, negro, havaiano criado na Indonésia, um conciliador que faria inveja a Tancredo Neves, superou Hillary Clinton e agora é o democrata favorito (30% das preferências) no cáucus de Iowa no início de janeiro, a “porta de entrada” para a Casa Branca. Do lado republicano, o pastor batista Mike Huckabee, 52 anos, ex-governador do Arkansas, que é contra o aborto, o casamento homossexual e pesquisas com embriões humanos, saiu de 8% para 24% nas pesquisas, podendo superar o também extrema-direita Mitt Romney, até agora o favorito no Estado.
A virada de Huckabee, anunciada às vésperas do feriado de ação de Graças, foi atribuída ao conservadorismo dos eleitores religiosos de Iowa. Já a ascensão de Obama decorre, principalmente, do cansaço do eleitorado com os “dois países” que se formaram depois da eleição de George W. Bush: as costas Leste e Oeste, progressistas, e os estados centrais, conservadores. Em termos nacionais, a ex-primeira dama Hillary Clinton, cuja plataforma está centrada na reforma do sistema de saúde, ainda domina a preferência dos democratas, ao passo que o ex-governador de Nova York, Rudy Giuliani, que se auto proclama o salvador da cidade depois de 11 de setembro, é o favorito entre os republicanos com o seu discurso antiterrorismo.
Embora os candidatos ainda tenham de passar por primárias importantes, como New Hampshire e Carolina do Sul, está cada vez mais clara a divisão do eleitorado. O advogado Obama repete a história do pastor Martin Luther King, Jr. saindo da obscuridade com apenas um – e grandioso – discurso, durante a convenção democrata de 2004, quando fez uma apologia do nome do país, Estados Unidos da América, que segundo ele sugere a união de todas as raças, credos e nacionalidades. O discurso entrou na galeria dos grandes momentos do Partido Democrata e fez com que ele se tornasse, dois anos depois, o primeiro candidato a receber proteção integral do Serviço Secreto.
Já Huckabee parece ter nascido de um livro de auto-ajuda. Gaba-se de ter perdido cerca de 50 quilos em três meses, e acha que a criminalidade diminui através do medo dos bandidos diante de “cidadãos armados”. Recentemente, anunciou a adesão à sua campanha de atores de filmes violentos ou lutadores de luta livre. É favor da pena de morte e da guerra no Iraque.
Huckabee nunca fumou ou bebeu. Depois de ter sido diagnosticado com diabetes em 2003 e ter sido avisado por seus médicos de que morreria no máximo dentro de 10 anos, fez regime, correu maratonas como de Nova York e, ainda, elegeu o perigo da obesidade como tema central de seus dois governos no Arkansas. Lá, traindo o mantra republicano, elevou os impostos e é criticado até hoje por isto. Obama, por outro lado, ainda fuma escondido dos eleitores e, no passado, experimentou maconha e cheirou cocaína. Desde pequeno, segundo sua autobiografia, publicada quando ainda estava na casa dos 30 anos, embala o sonho de ser presidente. Filho de pai queniano e mãe do Kansas, divorciados quando ele tinha dois anos, viveu a infância em Jacarta, Indonésia (o namorado de sua mãe é de lá) formou-se por Harvard e, depois do John F. Kennedy, é o político mais novo a ingressar no Senado norte-americano. Sua plataforma, embora conservadora sobre vários aspectos, traz elementos novos, como um provável diálogo com o Irã e Síria, caso seja eleito presidente
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Afinal, o que há de errado com o Citi?

A história do Citigroup, um conglomerado financeiro nascido em 1812 em Nova York, é uma sucessão de escândalos de tráfico de influência e brigas de diretores, mas nada calou mais fundo entre os acionistas do que o prejuízo de US$ 11 bilhões no terceiro quadrimestre deste ano, resultado não só da crise das hipotecas nos Estados Unidos, mas também da pura – e grandiosa – incompetência da sua direção.
O grupo, uma espécie de quartel general do capitalismo, é a maior empresa em ativos do mundo (quase US$ 2 trilhões), ostentando em seu currículo a popularização dos caixas eletrônicos e a introdução do conceito full service financeiro. Agora vem se juntar ao clube dos sem-lucro de Wall Street: Bear Stearns (prejuízo de US$ 450 milhões), Morgan Stanley (US$ 3,7 bilhões) e Merrill Lynch (US$ 7,9 bilhões).
Desconta-se que o Citi é uma colcha de retalhos resultante de aquisições desde a sua criação. O que, por si só, representa um transatlântico ingovernável. Mas o que estava fazendo o CEO Charles Prince quando a crise das hipotecas pegou fogo em 2006 e foi derreter-se no verão norte-americano em meados deste ano? O homem ganhava quase US$ 30 milhões, opções de ações, prêmios semestrais, gratificações, clube de golfe, cartão de crédito, jatinhos e o beija-mão de toda a comunidade empresarial... e mesmo assim não fez nada?
Diz-se que os problemas encontrados nas grandes empresas são os mesmos que você enfrenta aí no dia a dia da sua firma. A diferença são os números. E foram justamente os números que derrubaram o Citigroup, em fórmulas do que eles chamam de colaterização de débitos hipotecários, uma coisa tão difícil de entender que, como diz o ditado, dá para desconfiar. Na hora do “vamos ver”, as explicações foram mais complicadas ainda. Enquanto todo mundo estava ganhando dinheiro tudo bem, mas agora que a ficha caiu, só Prince foi mandado para a casa.
Desde que ele foi defenestrado do cargo, o conselho de diretores está, agora, à procura de um comandante. Paga-se bem, mas o problema é que o cargo é uma cadeira quente: o novo CEO terá de manejar um barco de 332 mil funcionários e 200 milhões de contas correntes em cerca de 100 países. Cada canetada sua pode balançar os Estados Unidos, a começar pela Bolsa de Nova York, cujo índice Dow Jones o Citi compõe e influencia.
Na última semana, um atento analista recomendou vender as ações do Citi, já que a exposição do conglomerado aos mercados de crédito continua sendo preocupante, especialmente para o seu maior acionista individual, o príncipe Al-Walid Saud, o 13º homem mais rico do mundo e proprietário de 10 bilhões em ações, ou 4% do total.
A crise é de liderança, concluiu o The Wall Street Journal esta semana. Por isto o conselho de diretores está se reunindo para avaliar os sucessores de Prince, “que agora deve ser um rei”, brinca o jornal. O conselho conta com nomes influentes, como Richard Parsons, CEO da Time Warner, Franklin Thomas, ex-Ford Foundation, o ex-secretário do Tesouro de Bill Clinton, Robert Rubin, que foi nomeado chairman depois que Prince foi convidado a se retirar, e o brasileiro Alain Belda, da Alcoa.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Onda verde aquece negócios de Al Gore

Prêmio Nobel da Paz de 2007 e “ex-futuro-presidente dos Estados Unidos”, como chama a si mesmo, o democrata Al Gore enterrou de vez esta semana os sonhos dos fãs que esperavam sua candidatura à sucessão de George W. Bush: será sócio de uma das maiores empresas de capital de risco do mundo, a Kleiner Perkins Caufield & Byers (KPCB) que, após o advento da era da informação, agora investirá em negócios sustentáveis, especialmente na área de energia. O setor vislumbra um mercado potencial de US$ 6 trilhões nos próximos anos.
Como empresário – além de dono da Current TV, um canal a cabo para jovens, faz parte dos conselhos da Apple e da Google e ainda ganha dinheiro com livros e o documentário Verdade Inconveniente, ganhador do Oscar - Gore já é milionário (cobra US$ 100 mil por palestra) e poderia se aposentar na sua mansão em Nashville, Tennessee. Mas agora, diante da urgência de um desastre planetário com a elevação da temperatura, já existe o consenso de que quem vai salvar a Terra é a iniciativa privada, muito mais do que governos e tratados internacionais.
“Trata-se da combinação do Plano Marshall e dos Projetos Manhattan e Apolo ao mesmo tempo”, comparou o ex-vice-presidente que hoje, segundo pesquisas, é a personalidade mais popular nos Estados Unidos. Há três anos Gore fundou um fundo de investimentos sustentáveis, o
Generation Investment Management, mas agora virou sócio de uma empresa referência na Sand Hill, a rua do Vale do Silício que é o coração do venture capitalism no mundo. Seu papel será uma espécie de radar para novos negócios no setor.
A KPCB está para o capitalismo de risco assim como Steve Jobs, da Apple, está para o computador pessoal. Foi de lá que saíram investimentos iniciais para empresas como Google, Amazon, Sun e Netscape. Até 2009 a firma investirá pelo menos US$ 600 milhões em negócios que produzam tecnologias que reduzam a emissão de dióxido de carbono. Desde o ano passado foram investidos US$ 270 milhões em 26 empresas que fazem desde micróbios que destroem manchas de óleo até carros elétricos. 12 dos seus 22 sócios gastam a maioria do tempo em projetos “verdes”. “Estamos no início de uma nova revolução industrial, e significativamente maior e mais rápida”, disse Gore.
Na onda de Gore e seus sócios, grandes empresas americanas estão mergulhando no mundo da sustentabilidade. O Wal Mart, por exemplo, a maior empresa do mundo, acaba de fazer um evento para os seus 65 mil fornecedores em Bentonville, Arkansas, anunciando a construção de lojas ecológicas e, melhor ainda, redução no empacotamento de produtos. A Coca Cola já está investindo na substituição de seus nove milhões de refrigeradores e vending machines para reduzir e emissão de dióxido de carbono.
Embalado nesta virada da América Corporativa, Al Gore poderá, na iniciativa privada, realizar sonhos que talvez não pudesse realizar caso fosse presidente dos Estados Unidos. O também ex-senador e deputado federal é formado por Harvard em Letras, foi correspondente de guerra (embora se opusesse ao conflito do Vietnã, foi convocado e serviu como fotógrafo de uma revista especializada, Army Flier) e é uma espécie de reserva moral dos Estados Unidos.


. Acima de qualquer suspeita

Políticos são cobrados por roubalheiras ou escândalos sexuais, mas Al Gore, 59 anos, é questionado por coisas aparentemente inofensivas, com o rastro de carbono que provoca quando viaja de avião ou quando liga as luzes de sua mansão de US$ 2,3 milhões.
Para se defender, e não deixar nenhuma dúvida quanto aos seus propósitos, Gore paga pelo carbono emitido pelos aviões que utiliza através de websites como o
http://www.terrapass.com/. Acaba de instalar 30 painéis solares na sua casa e só utiliza carros híbridos como Prius, da Toyota.
Depois de um dos maiores revezes políticos da história, perder a eleição de 2000 para George W. Bush no Colégio Eleitoral mas ganhar no voto popular, Gore é o centro de uma revolução empresarial sem precedentes. Seu poder de mobilizar recursos políticos e financeiros para as chamadas empresas-verdes é inigualável no cenário de negócios nos Estados Unidos.
Na Kleiner Perkins Caufield & Byers, ele vai trabalhar pelo menos cinco dias por mês – até já comprou um apartamento em San Francisco, perto da sede da empresa – e vai dividir com os outros 22 sócios uma taxa de 2% de administração e cerca de 20% do dinheiro ganho com a venda ou abertura de capital das novas empresas de tecnologias limpas, como são chamadas.
Ao contrário dos investimentos na tecnologia da informação, até agora pouca gente ganhou dinheiro com empreendimentos que fazem painéis solares, aproveitam a energia das marés ou do hidrogênio a preços competitivos. Mas, com o petróleo beirando a US$ 100 o barril e o governo dando incentivos com programas e redução de impostos, a nova corrida do ouro já está em marcha.
Gore, até a década de 80 um político interiorano sem expressão nacional, transformou-se quando quase perdeu seu filho, Al Gore III, então com seis anos, num desastre de carro em 1989 em Baltimore, Maryland. Durante o longo período de restabelecimento, Gore escolheu ficar no hospital ao lado do filho, deixando em segundo plano da candidatura à presidência dos Estados Unidos em 1992.
Foi neste tempo que escreveu o livro “Terra em Equilibro”, uma reflexão que o levaria a tornar-se, uma década depois, um fenômeno respeitado internacionalmente. Ele fala sobre o assunto no documentário Verdade Inconveniente, ganhador do Oscar de Melhor Documentário em 2006, mas segundo os críticos “a mais famosa apresentação em PowerPoint da história”.
Seu filho foi preso em julho deste ano por posse de maconha e barbitúricos em Laguna Hills , na Califórnia, depois de atingir 100 milhas por hora em seu Toyota Prius. A imprensa americana correu atrás de Gore pedindo entrevistas. Ele atendeu a todos dizendo que se tratava de uma questão privada e, como tal, não falaria sobre o assunto.

Microtendências, ou Deus está nos detalhes

Você sabia que, cada vez mais, jovens norte-americanos estão fazendo crochê? Que o judaísmo é a religião mais querida aqui? Que está havendo uma explosão de nascimento de pessoas canhotas? Que a população de solteironas nos Estados Unidos quase dobrou de 1970 a 2005? Que existem cerca de 30 milhões de pessoas tatuadas? Ou que um milhão de homens norte-americanos fizeram operação plástica em 2006? É um punhado de informação (ou cultura inútil) que a gente vê aqui e ali, e que até hoje não sabia que se tratava de uma microtendência, um termo inventado recentemente que está dando o que falar nos Estados Unidos.
Tudo começou quando o especialista em pesquisas Mark J. Penn, hoje CEO da Burson-Marsteller, uma das maiores empresas de relações públicas do mundo, trabalhava para o então presidente Bill Clinton na Casa Branca, em 1996. Ele começou a perceber um fenômeno: mulheres brancas, casadas, moradoras dos afluentes subúrbios norte-americanos, devotadas aos filhos, estavam se tornando, muito mais do que os maridos, uma força política expressiva. Um detalhe que passava desapercebido nas pesquisas.
Penn as apelidou de “soccer moms”, não no sentido literal de mães de futebol, mas aquele tipo de mulher atribulada que leva os filhos de atividade em atividade, em carrões espaçosos, e que até então, pensava-se, estavam indefinidas politicamente. Clinton entendeu a mensagem, levou o assunto a sério e prometeu medidas que lhes agradavam, como coibir o tabaco entre os adolescentes, obrigar escolas a fazer testes de detecção de drogas e leis que limitam a violência na TV. Acabou se reelegendo com a ajuda delas.
Penn escreveu um livro sobre estes pequenos e intensos grupos que têm suas próprias necessidades e raramente aparecem no radar de marqueteiros, varejistas, publicitários, jornalistas ou quem quer influenciar os hábitos da sociedade. Junto com E. Kinney Zalesne, que também serviu na Casa Branca, lançou Microtendências –As Pequenas Forças por Detrás das Grandes Mudanças do Amanhã –, que não sai da lista dos mais vendidos do The New York Times desde setembro.
O livro reúne 75 microtendências em assuntos tão díspares quando amor, trabalho, religião, saúde, vida familiar, política, dinheiro, educação, lazer, moda e dietas. São coisas que gente, por assim dizer, não sabia que sabia. Por exemplo, que embora nasçam mais meninos que meninas, há falta de homem no mundo. Adolescentes machos morrem mais do que adolescentes fêmeas, enquanto que a população de gays homens é o dobro de mulheres lésbicas, pelo menos nos Estados Unidos. Ou que está explodindo o número de aposentados que, por terem uma vida mais longa ou por não gostarem de ficar em casa, continuam trabalhando. Ou ainda que está aumentando o número de pais-avós, que têm filhos depois de fazer o 55º aniversário.
A conclusão é que hoje em dia o mundo não age monoliticamente, mas é uma coleção de pequenos pontos que precisam ser juntados, e examinados, um a um. O mundo virou um grande Starbucks, onde cada um dos milhões de clientes que entra em suas 13 mil lojas é tratado pelo nome e pode escolher uma das 11.735 mil variedades de café, chá ou outra bebida qualquer. Cada um é cada um ou, como se diz, cada caso é um caso. Deus está nos detalhes.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Rei do xadrez quer ser presidente

Os Estados Unidos assistiram na semana passada à genialidade de Garry Kasparov, 44 anos, o maior enxadrista de todos os tempos, o russo-armênio-judeu nascido no Azerbaijão que derrotou com mão de ferro seus adversários e que agora encabeça a oposição ao presidente Vladimir Putin para a eleição de 2008.
Kasparov, que chegou a vencer por duas vezes o Deep Blue, o computador da IBM construído para derrotá-lo, encantou a platéia americana em programas de TV como o 60 Minutes (CBS), Bill Maher (HBO) e Stephen Colbert (Comedy Central) com sua inteligência, perspicácia e inglês shakespeariano. Saiu aplaudido em todas as ocasiões. Pena que o eleitorado esteja a mais de 7 mil quilômetros de distância e não entenda inglês.
Até Kasparov aparecer nos Estados Unidos a pretexto de lançar seu 22º livro, Como a vida imita o xadrez, acreditava-se que os gênios do jogo inventando pelos persas no século 12 fossem geniais apenas para jogar xadrez. Mas ele, que lidera a coalizão "A Outra Rússia", onde coabitam diversas correntes políticas, inclusive a extrema direta, está mostrando o contrário. Sobressai-se com respostas que deixam os jornalistas desarmados. Exemplo:
- Como o senhor quer ganhar a eleição contra um presidente (Vladimir Putin) que tem 80% da preferência da opinião pública? - indagou Maher.
- Se George Bush controlasse a imprensa e os institutos de pesquisa ele teria um índice de aprovação de 90% - respondeu o enxadrista.
Kasparov foi preso, multado e investigado pela polícia russa. Milionário e famoso - é um herói nacional - anda com guarda-costas, varia seus trajetos diariamente e manda a família com freqüência ao exterior. Sua luta é para trazer de volta a democracia à Rússia, que desde o advento de Putin, há sete anos, "estabeleceu censura à imprensa, cancelou eleições, entregou as empresas e recursos naturais aos seus aliados e parece não ter muita vontade de entregar o cargo", diz.
- É uma ameaça não só ao futuro do meu país, como à estabilidade de todo o mundo - completa.
Kasparov reconhece que está diante da maior jogada da sua vida. Pelo menos três opositores de Putin já se deram mal. A repórter investigativa Anna Politkovskaya foi morta em seu prédio, em Moscou. O ex-agente da KGB Alexander Litvinenko foi envenenado em Londres com polônio. E Mikhail Khodorkovsky, um dos bilionários russos depois do fim da União Soviética, está preso na Sibéria. Não há evidência de que Putin esteja por trás destes atos, mas há consenso de que coisas ruins acontecem a pessoas que desafiam sua autoridade. Kasparov sabe que poderá figurar nesta lista:
- Faço uma política de redução de riscos, embora ninguém esteja seguro na Rússia de Putin - afirma.
Vladimir Posner, apresentador de um programa de entrevistas, diz que Kasparov é um brilhante jogador de xadrez, mas hoje, em termos políticos, uma figura decorativa.
- Ele não seria eleito nem para ser o dono da carrocinha de cachorros da cidade - brinca.
Para Vyacheslav Nikonov, assessor do Kremlin, Kasparov representa "apenas 3% ou 4% do eleitorado liberal que não está satisfeito com Putin".
- Nas pesquisas de opinião, você não vê a democracia entre os 30 principais itens que preocupam os russos. À frente, queremos empregos, o fim da corrupção, do crime e a volta da assistência governamental - sustenta o especialista.
É o que Putin está fazendo.

Macaco, Tião, Cacareco e Cia

Aos ilustres nomes do título acima adiciona-se, agora, o de Stephen Colbert, o maior humorista americano da atualidade, que semana passada anunciou ser candidato à Presidência dos Estados Unidos por ambos os maiores partidos, Republicano e Democrata. Colbert registrou-se quarta-feira pela Carolina do Norte, o Estado onde foi criado, e com sua força – seu programa The Colbert Report é um dos mais vistos na TV americana – é capaz de atrapalhar o caminho de muita gente, da mesma forma que advogado dos consumidores Ralph Nader roubou votos do democrata Al Gore e deu a presidência americana ao republicano George W. Bush em 2000.
Tião era um macaco, Cacareco um rinoceronte, mas Colbert é diferente. Ao lado de Jon Stuart, do The Daily Show, representa uma incrível tendência na política americana: os eleitores preferem se informar sobre política em programas que ridicularizam os políticos. A política tradicional, aquela que os gregos elegeram como a atividade mais importante do ser humano, ficou restrita aos sonolentos debates da TV e nas mãos de poucos eleitores (30% da população) que ainda se dispõem a sair de casa e votar.
Em seu programa de meia hora no final da noite no Comedy Central, Colbert desdenha de todo mundo, especialmente dele mesmo. Ele era um obscuro ator quando começou a trabalhar para o The Daily Show, onde fez sucesso como correspondente sênior na Casa Branca entre 1997 a 2005. A receptividade foi tão grande que o próprio Jon Stuart convidou (e produziu) um programa para ele, o The Colbert Report, uma paródia ao programa do porta-voz da direita, Bill O’Reilly, do The O’Reilly Factor, na Fox News.
` Colbert começou a chamar atenção dos políticos quando iniciou uma série de entrevistas com boa parte dos congressistas americanos no Capitólio, e freqüentemente parecia dormir à frente dos deputados ou fazer perguntas sem nexo que deixavam os parlamentares perplexos. Os próprios deputados e senadores se ofereciam para aparecer no programa, confiando na alta audiência. Mas a coisa ficou tão ridícula que a liderança do Partido Democrata recomendou que os deputados evitassem o programa para não ridicularizar o Parlamento.
O sucesso do comediante só aconteceu entre o grande publico quando, no tradicional jantar da Associação dos Correspondentes da Casa Branca, chocou o presidente Bush com piadas desrespeitosas para um chefe de Estado, seja ele qualquer. De repente, sua audiência subiu cerca de 30% no Comedy Central. Afinal, Colbert não tem compromisso com ninguém, nem com ele mesmo. Se autodescreve como “bem intencionado, pouco informado...um idiota de alto nível”, ao mesmo tempo “egomaníaco, xenófobo e anti intelectual”.
Uma pesquisa da Public Opinion Strategies mês passou descobriu que Colbert receberia 2.3% dos votos democratas, mais do que Bill Richardson, Christopher Dodd, Dennis Kucinich e Mike Gravel, que disputam com Hillary Clinton e Barack Obama a indicação do partido para a presidência dos Estados Unidos. Ele receberia 13% se sua candidatura fosse independente contra Rudy Giuliani, o favorito dos Republicanos, ou mesmo contra Hillary Clinton.
Os resultados são especialmente contundentes entre jovens de 18 a 29 anos, onde Colbert tem 28% da preferência do eleitorado. Um comentarista de TV chegou a dizer que ele estaria à frente dos todos os demais candidatos agora em meados de novembro. No Facebook, o site de relacionamento mais famoso do mundo, ele tem um fã clube de mais um milhão de jovens, e é considerado o grupo que mais cresce em toda a história do site – 83 pessoas por minuto.
Colbert diz já ter 15 milhões de dólares no caixa de campanha, através de doações do Doritos, a fritura vendida pela Pepsi. Já disse que, se eleito, “será tão bom para o país quando Doritos é para o seu corpo”. Os aspectos legais da campanha – se ele pode ou não ser candidato, principalmente- já dividem democratas e republicanos. Muitos blogueiros o chamam de “O Retrocesso Colbert”, por invadir o território político cruzando a linha da sátira e, assim, bagunçando todo o processo.
Colbert presidente pode ser uma sátira exagerada, como no filme “O Homem do Ano”, com Rob Willians. Mas ele já foi eleito pela revista Time uma das celebridades mais influentes de 2006, enquanto o New York Magazine o escolheu como uma das mais influentes personalidades da mídia. Em 2007, foi eleito pelo U.S. Comedy Arts Festival como A Personalidade do Ano e Um dos mais sexy homens vivos, entre outros prêmios. A coisa ainda está na brincadeira, mas como na história do bode na sala, está começando a incomodar. Seriamente.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

A espiã traída pela Casa Branca

Depois de tomar café com os filhos, na manhã de 14 de julho de 2003 num subúrbio de Washington, a agente da CIA Valerie Plame Wilson lia o Washington Post quando levou o maior susto da sua vida. Um dos mais famosos colunistas da capital americana, o conservador Robert Novak, revelava que a espiã, há 18 anos trabalhando na agência, era a mulher do ex-embaixador Joseph C. Wilson IV.
Wilson, ex-diplomata com cara de galã, tinha chegado da África e revelado no New York Times que o enriquecimento de urânio em Níger para servir aos propósitos bélicos do ditador do Iraque, Saddam Hussein - principal razão alegada por George Bush para invadir o país - não passava de lorota.
Revelar a identidade de um agente secreto, segundo a lei americana, é crime que prevê multa de US$ 50 mil e 10 anos de cadeia. A agente deduziu que, a partir dali, seus filhos, seu marido e a sua rede de relações estavam em perigo. Tornavam-se alvos da Al Qaeda e de Osama bin Laden.
Até domingo passado, cinco anos depois, Valerie - uma loira estonteante nascida no Alasca em 1963 que poderia ser a versão feminina do 007 James Bond, filha e irmã de militares - foi obrigada, por força do cargo, a ficar calada. Qualquer manifestação poderia aguçar a ira da própria CIA.
A agente secreta, treinada para ser submetida a interrogatórios com torturas físicas e psicológicas, escolheu Katie Couric, do 60 Minutes, da CBS, para botar a boca no trombone. Mas o que se esperava ser uma cartada para desmascarar Bush virou blefe, conversa de madames em rede nacional.
Ela acabou de lançar sua biografia, Jogo justo - Minha vida como espiã, traída pela Casa Branca (Simon & Shuster), numa alusão ao ex-assessor político de Bush, Karl Rove, que considerou a revelação de sua identidade um jogo justo de retaliação contra seu marido.
Metade do livro foi rabiscada pelos seus ex-chefes, a pretexto de proteger a segurança nacional. E, assim, pela primeira vez na história, um livro de US$ 26 dólares foi publicado pela metade, o que gerou uma ação judicial contra a CIA. Numa entrevista do tipo "de mulher para mulher", Valerie revelou o que é ter uma vida tranqüila - mesmo como agente, trabalhava só meio expediente para cuidar dos filhos - e ser devassada para justificar uma guerra que ceifou a vida de 4 mil americanos e provocou gastos de quase US$ 1 trilhão.
A revelação da identidade de Valerie gerou pressões do Poder Judiciário, que quis saber de onde saiu a informação publicada nos jornais, traindo um preceito em voga desde que a imprensa existe: o direito de não revelar as fontes.
Robert Novak, que deu o furo no Washington Post, fez acordo com a Justiça e livrou-se da cadeia para não ter que revelar quem falou. Judith Miller, do NYT, passou 85 dias no xadrez por se recusar a fazer o mesmo. Os patrões dos jornalistas gastaram pelo menos US$ 5 milhões com advogados.
A exemplo do Watergate, revelou-se que a fonte da informação era a Casa Branca, do gabinete do vice-presidente Dick Cheney. Para proteger a instituição da Presidência, o assessor I.ewis "Scooter" Libby, pagou o pato.
Foi condenado a multa de US$ 250 mil e 30 meses de prisão, comutada pelo presidente Bush, em julho deste ano. Valerie, que se mudou para o Novo México, aposentou-se da CIA e hoje vive para o marido - que se tornou consultor internacional - e os filhos.
A maior vítima foi a verdade. Como não foi comprovado que Sadam tinha armas de destruição em massa em seu quintal, ou qualquer relação com o Al Qaeda, Bush e Cheney estão devendo explicação para a guerra, mais longa que a Segunda Guerra Mundial, e no meio de facções que duelam há séculos.

Brasil, atrção na terra de Clinton e Sam Walton

Distante, despovoado e empoeirado dos filmes de cowboy, o Estado de Arkansas, ao sul do rio Mississipi, no coração do chamado cinturão bíblico dos Estados Unidos, sempre foi conhecido como o reino dos frangos, porcos e bois por ser, há muitos anos, o maior fabricante de proteína animal no mundo.
Há um pouco mais duas décadas, no entanto, o Estado ganhou celebridade por abrigar a maior empresa mundial, o Wal Mart, criado por Sam Walton, de Bentonwille, e William Jefferson "Bill" Clinton, o 42º presidente norte-americano, da cidade de Hope. Clinton está tão onipresente no Arkansas quanto sua mulher, Hillary, está na liderança das pesquisas de opinião para a sucessão de George W. Bush.
O que pouca gente sabe é que o Brasil é a maior estrela no radar de negócios do Arkansas. Sentado em bilhões de dólares dos Rockfeller, que se mudaram para cá no século passado, ou na riqueza trazida por empresas como a Tyson Foods, processadora de carnes, ou da transportadora de caminhões J. B. Hunt, ambas gigantes globais, governo, universidade e a iniciativa privada se uniram para conquistar o Brasil.
Por quê? A primeira resposta é o etanol, mas a partir daí as possibilidades são infindáveis. “Por sermos uns dos estados mais centrais dos Estados Unidos, termos um eficiente sistema de transporte e estarmos próximos aos portos de Houston, no Texas, e Nova Orleans, na Louisiana, nos consideramos candidatos naturais para receber e distribuir o notável combustível brasileiro”, diz John Kadyszewski, da Winrock International, uma fundação mantida pelos Rockfeller e sediada no Estado.
Aqui vão algumas oportunidades para as empresas brasileiras no Arkansas (pronuncia-se arcanssá, com o “r” bem puxado, e significa na linguagem indígena “povo do rio abaixo”):
- Aeronáutica – O estado tem fábricas da francesa Dassault Falcon Jet e das americanas Lockheed Martin e Raytheon. A ênfase é na finalização da produção de aviões. Para quem produz ou transforma peças para a indústria aeroespacial, como o cluster de São José dos Campos ao redor da brasileira Embraer, é uma excelente oportunidade para diversificar o portfólio de clientes.
- Logística – Com 100 aeroportos, 26 ferrovias e recentes investimentos de US$ 1 bilhão em suas estradas, Arkansas não só tem as duas maiores empresas transportadoras do mundo, como a J. B. Hunt, mas também 2,4 mil quilômetros de rios que levam aos principais portos norte-americanos. Para o pessoal de logística no Brasil, um lugar na metade do caminho entre o México e o Canadá, ou entre as Carolinas e a Califórnia, é um paraíso ainda a ser explorado.
- Educação - Energizada como doações de bilhões de dólares dos acionistas da Wal Mart e da Tyson Foods, a Universidade do Arkansas é líder em setores tão díspares quanto realidade virtual e nanotecnologia. Com anuidades que não passam de US$ 5 mil dólares, ínfimas se comparadas a outras instituições norte-americanas, a instituição quer atrair suas congêneres brasileiras com programas de intercâmbio de estudantes e professores. Uma das grandes atrações da Universidade é o Clinton School of Public Service, que oferece MBA para líderes que queiram fazer o bem.
- Wal Mart – A maior empresa do mundo, com 1,9 de funcionários, vendas de US$ 349 bilhões e presente em 14 países, é um país em si. Tornar-se fornecedor do Wal Mart, embora tenha de se passar pelo calvário das negociações ditadas pelo mantra “economizando para os clientes, e assim melhorando suas vidas”, é um passaporte para o sucesso. Só nos arredores de Bentonville, cerca de 12.500 fornecedores disputam os espaços para ficar mais perto da maior compradora de produtos do mundo.
- Biotecnologia – Criada por incubar empresas de biotecnologia com o dinheiro das patentes científicas, a Bioventures já tem no currículo sucessos das descobertas no tratamento do mieloma (câncer no plasma sanguíneo), prolongamento da vida de pacientes com câncer, recuperação de tecidos e outras maravilhas da genética. Já criou 19 empresas e detém hoje 165 patentes.
“O Brasil é candidato natural a ser um dos nossos grandes parceiros”, diz W. Dan Hendrix, CEO do World Trade Center de Arkansas, o centro de uma máquina unida, abastada e eficiente que trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana, para atrair investimentos e outros negócios para o Estado. Hendrix é também um fundraiser profissional. Já conseguiu um bilhão de dólares para a Universidade do Arkansas.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A quem interessa o fim da imprensa?

Se a imprensa acabasse, ou perdesse sua independência, George Bush transformaria o mundo num quintal dos Estados Unidos, Lula e sua camarilha jamais sairiam do Palácio do Planalto e Hugo Chávez... bem, o ditador venezuelano já deu uma mostra do que seria o mundo sem jornais, TVs, rádios que exerçam a liberdade de expressão.
Desde a bolha da internet, o modelo de negócios da imprensa está a perigo porque os anunciantes dispõem de outras dezenas de meios para atingir seu público. Emails, outdoors, TVs, blogs e sites de relacionamento estão drenando o dinheiro que ia para os jornais. Assim, o jornalismo investigativo, o mesmo que extirpou Richard Nixon ou Fernando Collor da presidência, ou descobriu o roubo da Enron ou o escândalo do mensalão, está a perigo.
Mas a sociedade está reagindo. Nos Estados Unidos, anunciou-se na semana passada mais uma organização sem fins lucrativos que, fundada por doações milionárias, tentará suprir a partir de janeiro de 2008 a falta de recursos dos jornais para colocar repórteres nas ruas que descubram as malversações de dinheiro público ou privado.
A Pro Publica, com orçamento de US$ 10 milhões anuais, começará contratando 24 jornalistas em Nova York (e mais dezenas de administradores) para, através de matérias investigativas, distribuir gratuitamente o material entre os grandes jornais, como o The New York Times e o Los Angeles Times.
Depois do Center for Investigative Reporting em San Francisco, e do Pulitzer Center on Crisis Reporting em Washington, é a terceira organização do tipo nos Estados Unidos.
No caso do ProPublica, os financiadores são o casal Herbert M. e Marion O. Sandler, ex-executivos do Golden West Financial Corporation, baseados na Califórnia, que ficaram ricos vendendo o negócio de hipotecas para o Wachovia Corporation por US$ 26 bilhões recentemente. Ficaram com US$ 2.4 bilhões no bolso. Outras fundações também participam do projeto com doações menores.
O casal, já na casa dos 70 anos, é conhecido como os segundos maiores filantropistas dos Estados Unidos em 2006, doando cerca de 1,3 bilhão de dólares ao Sandler Family Suporting Foundation. No passado, eles financiaram pesquisas na área de asma e malária, bem como o tratamento da Doença de Chagas na América do Sul. Os Sandler também doaram recursos para grupos de diretos humanos como o American Civil Liberties Union e o Human Rights Watch.
Eles também são apoiadores do Partido Democrata, o que levanta suspeitas sobre a imparcialidade do novo serviço de notícias. “Mas a página editorial do The Wall Street Journal é também um porta voz da direita nos Estados Unidos”, disse o presidente e editor chefe do novo serviço, Paul E. Steiger, ele mesmo ex-editor do WSJ por dezesseis anos, onde fez a redação ganhar 16 prêmios Pulitzer, o Prêmio Esso dos norte-americanos.
Em entrevista à PBS, a rádio pública norte americana, Steiger adiantou que o sucesso do Pro Publica será medido pelo número de funcionários públicos defenestrados do poder ou de empresas privadas indo para o limbo por escolherem as chamadas práticas não republicanas. O conselho será ocupado por gente de peso, como Henry Louis Gates Jr., professor de Harvard especializada em estudos africanos, Alberto Ibarguen, ex-editor do the Miami Herald, James A. Leach, um ex-congressista do Iowa que dirige o Harvard’s Institute of Politics, e Rebecca Rimel, presidente do CEO do Pew Charitable Trust.
Estes serviços terão que se sobrepor a uma antiga prática dos grandes jornais, que é somente assinar serviços de agências de notícias, ou, nos Estados Unidos, trocar materiais especiais entre si. Mas os especialistas dizem que, com a crise financeira que assola os jornais, o serviço será benvindo.
“Eles estão de olho em alternativas de suporte para um jornalismo ambicioso”, disse Stephen b. Shepard, diretor da Escola de Jornalismo da City University, em Nova York, ao jornal The New York Times. “Paul E. Steiger tem a credibilidade e o discernimento para ter sucesso e, se eles fizerem um bom trabalho, obviamente os jornais aceitarão publicar as matérias”.
A situação ideal, no entanto, é que as três partes envolvidas nesta revolução que atinge a imprensa – público, mídia e anunciantes – cheguem a uma fórmula que garanta a perenidade dos jornais, que muito mais do que as outras mídias servem de fórum para a discussão de novas (e antigas) idéias, uma espécie de hiper ventilação dos canais democráticos que são a base das sociedades mais adiantadas em todo o mundo.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O que você faria se soubesse quando será?

Como a certeza da morte, e como dizia o jurista Saulo Ramos em sua recente biografia Código da Vida, carregamos conosco a incômoda pergunta: mas quando? O professor Randolf Frederick Pausch, 43 anos, casado e três filhos pequenos, PhD em ciência da computação na Universidade Carnegie Mellon, morrerá dentro de três a seis meses de câncer no pâncreas.
Randolf, ou Randy, foi aplaudido de pé por 400 alunos e professores da universidade quando, no início de setembro, entrou no auditório para dar a última aula, uma tradição das universidades – mas para mestres que estão se aposentando ou abandonando a cátedra.
Ele agradece os aplausos, pede que parem de aplaudir (“me deixem merecer, primeiro”, e a platéia responde “você já merece”) e depois inicia um fantástico show de vida, esperança e gratidão, tema de reportagens de duas grandes redes de TV dos Estados Unidos, a ABC e a CBS.
A aula, gravada em vídeo para que seus filhos pequenos (5, 2 e 1 ano) assistam quando entenderem que todos nós vamos para o céu (ou o inferno), recebeu o título de “Realizando Os Sonhos da Infância”. Tornou-se também um dos vídeos mais vistos na Internet.
Durante 30 minutos, em tom otimista, fazendo às vezes a platéia gargalhar (e chorar), ele discorre sobre a ciência da computação (ele é um dos inventores da realidade virtual, um programa chamado Sofia), dá dicas para a melhoria do ensino e, na melhor tradição, faz profundas reflexões sobre sua área de conhecimento.
Depois começa a parte mais impressionante. Randy avisa que, se alguém quiser chorar, que suba até o auditório e o faça para que ele, então, consiga ter pena de si mesmo. Mostra, como um cientista, diversos raios-x de órgãos do seu corpo contendo 10 tumores malignos que o levarão à morte com data anunciada.
Quando criança, Randy era do tipo que trocava qualquer diversão por experimentos de física, matemática ou astrologia. Aos oito anos, quando atravessou os Estados Unidos para visitar a Disneylândia em companhia dos pais, decidiu que não queria somente ver o Pato Donald ou Mickey, mas sim criar parques de diversões futuristas.
Logo que recebeu seu PhD pela universidade, enviou uma carta para a Disney falando de suas habilidades e, tempos depois, recebeu outra carta com um polido não. Randy não se deu por vencido. Batalhou até criar, depois de formado e com um time de cientistas, um novo parque de atrações para a Disney.
Dos sonhos de infância, o professor ainda fez outra proeza: praticar experimentos a zero grau de gravidade, dentro daqueles aviões que sobem a grandes altitudes e caem centenas de metros repentinamente. “Quando você faz as coisas certas”, disse ele, “o carma se encarrega de trazer as coisas boas para você”.
Randy também fala de seus pais. Quando adolescente, ao invés de pregar pôsteres de garotas ou de heróis nas paredes do quarto, rabiscou fórmulas matemáticas, ditados famosos e até uma “portinha” para chegar a outros planetas. “Se você é pai ou mãe, deixe seus filhos rabiscarem as paredes do quarto – tenho certeza de que isto não vai diminuir o valor sua casa”, recomenda.
Embora doente terminal, Randy demonstra boa aparência e, mais ainda, excelente preparo físico. Durante a aula, faz contínuas flexões de braços, às vezes com um braço só, para demonstrar sua saúde. A platéia vem abaixo.
Um dos slides projetados é um muro de tijolos. Randy diz que muros existem por uma simples razão: eles estão lá para testarem o quão importante é para você conseguir o que deseja – ou melhor, “eles estão lá para frear as pessoas que não desejam tanto assim conseguir os objetivos”.
Enquanto projeta os slides de seus professores e chefes durante os anos, Randy conclui que ajudar os outros a realizarem os sonhos é muito mais divertido do que realizar os próprios sonhos.
Ao final, dá um conselho: “quando você se sente magoado ou chateado com alguém, é porque você não deu ainda o devido tempo para que esta mágoa se dissipe”. Novamente aplaudido de pé, o professor recebe um abraço e um beijo de sua esposa, que chorava na audiência.
A platéia, então, descobre que naquele dia Randy estava fazendo aniversário. Comemorava 46 anos muito bem vividos.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Varig, volete para Los Angeles!

Agora que o Brasil acordou e inaugura hoje uma missão de 50 empresários à Costa Oeste americana, sob o comando do empresário Roberto Giannetti da Fonseca, da Fiesp, é chegada a hora de lutarmos para que a Varig ou outra companhia aérea de bandeira brasileira volte a fazer um vôo que fez sucesso de 1968 a 2001.
O Varig São Paulo-Los Angeles-Tóquio, primeiro através do DC-10, depois com o Jumbo 747 e finalmente com o MD-11, levou milhões de brasileiros para a capital japonesa, com uma providencial escala em Los Angeles. O vôo, que durava cerca de 12 horas, dependendo do vento, gastava muito combustível e exigia duas tripulações de cabine se revezando.
Começando no final da noite em São Paulo, a viagem atravessava a Amazônia, percorria o árido território mexicano e aterrissava em Los Angeles. Para nós a Varig era uma espécie de embaixada brasileira na Costa Oeste americana. “Estamos aqui, queremos fazer negócios, estamos trazendo empresários e turistas”, era a mensagem subliminar.
Um pouco diferente de hoje, as aeromoças eram jovens e bonitas, os pilotos velhos e experientes, o serviço de bordo era reconhecidamente o melhor do mundo: talheres de prata, uma variada seleção de vinhos, patê de foie gras na entrada e bombons na sobremesa. Até o pessoal da classe econômica era tratado como ser humano.
Dava prejuízo? Dava. No início não, mas com o tempo o Brasil fez um dos seus maiores erros históricos: esquecer aos poucos a Costa Oeste norte-americana, uma potência formada da Califórnia até o Alaska que vale pelo menos cinco vezes o PIB brasileiro. A corrida se dirigiu para a Costa Leste, onde quase dois milhões de brasileiros, grande parte ilegais, se amontoou.
Agora é diferente. Com a ajuda dos consulados brasileiros em Los Angeles e San Francisco, os empresários brasileiros estão fazendo de tudo para reconquistar a Costa Oeste, e daqui conquistar os países asiáticos, pois estas cidades, além de Seattle, são a porta para o Pacífico.
Nosso empresários pagam, no entanto, pela tortura da viagem de São Paulo até aqui, passando por Dallas ou Houston no Texas, ou Atlanta, na Geórgia, o que em outras palavras significa duplicar as horas de vôo entre os dois países.
Sai-se à noite do Brasil, chega-se no meio dos Estados Unidos nas primeiras horas da madrugada e pousa-se aqui quase cinco horas depois, enfrentando às vezes seis horas de fuso horário. Os brasileiros surgem aqui tresnoitados, atordoados e muitas vezes perdidos, sem energia para fazer negócios com Bill Gates ou passear na Disneylândia.
O pior é o transporte de carga. Sabe-se que o forte do tráfego aéreo é pago pela carga, acondicionada em imensos vãos um andar abaixo dos passageiros, ou em aviões especialmente desenhados para isto, os chamados cargos. Muitos dos produtos que estados como Califórnia, Oregon e Washington compram do Brasil são perecíveis, e não resistem às escalas atuais.
Por não ter linhas diretas regulares de passageiros ou de carga, ou mesmo por ser bem distante do Brasil, o frete vai ficando caro para a Costa Oeste, quando comparado a portos mais próximos. Mas os Estados Unidos, é só olhar no mapa, estão ainda mais perto do que a China, o Japão, a Europa e a África, e são os maiores compradores do planeta, inclusive do Brasil.
Só no ano passado compraram US$ 24,4 bilhões de nós, dos quais US$ 3,5 bilhões beneficiados pela isenção de impostos de importação. Muito pouco para um país que compra US$ 1,72 trilhão (isto mesmo, quase dois trilhões) de produtos e serviços de todo o mundo, dos quais apenas 1,3% originários do Brasil. Pagam em dólar, são organizados e eficientes e sempre demandam inovação e preços baixos, as bases do capitalismo eficiente.
Hoje em dia muitos brasileiros criticam os Estados Unidos por diferentes razões, desde o Governo Bush, a guerra no Iraque ou mesmo pela arrogância no trato dos negócios estrangeiros. Apesar das idas e vindas, Brasil e Estados Unidos têm histórias parecidas, com diferentes níveis de sucesso. De Carmem Miranda a Sônia Braga, de Pelé a Gisele Bündchen, somos queridos pelos nossos irmãos do norte.
Nossa língua portuguesa soa como música nos ouvidos dos gringos, nossas belezas naturais são reconhecidas e celebradas aqui. Fazemos etanol e aviões. Somos um povo afável, bonito, brincalhão, bom de fazer negócios. Só falta um avião.

Varig, volete para Los Angeles!

Agora que o Brasil acordou e inaugura hoje uma missão de 50 empresários à Costa Oeste americana, sob o comando do empresário Roberto Giannetti da Fonseca, da Fiesp, é chegada a hora de lutarmos para que a Varig ou outra companhia aérea de bandeira brasileira volte a fazer um vôo que fez sucesso de 1968 a 2001.
O Varig São Paulo-Los Angeles-Tóquio, primeiro através do DC-10, depois com o Jumbo 747 e finalmente com o MD-11, levou milhões de brasileiros para a capital japonesa, com uma providencial escala em Los Angeles. O vôo, que durava cerca de 12 horas, dependendo do vento, gastava muito combustível e exigia duas tripulações de cabine se revezando.
Começando no final da noite em São Paulo, a viagem atravessava a Amazônia, percorria o árido território mexicano e aterrissava em Los Angeles. Para nós a Varig era uma espécie de embaixada brasileira na Costa Oeste americana. “Estamos aqui, queremos fazer negócios, estamos trazendo empresários e turistas”, era a mensagem subliminar.
Um pouco diferente de hoje, as aeromoças eram jovens e bonitas, os pilotos velhos e experientes, o serviço de bordo era reconhecidamente o melhor do mundo: talheres de prata, uma variada seleção de vinhos, patê de foie gras na entrada e bombons na sobremesa. Até o pessoal da classe econômica era tratado como ser humano.
Dava prejuízo? Dava. No início não, mas com o tempo o Brasil fez um dos seus maiores erros históricos: esquecer aos poucos a Costa Oeste norte-americana, uma potência formada da Califórnia até o Alaska que vale pelo menos cinco vezes o PIB brasileiro. A corrida se dirigiu para a Costa Leste, onde quase dois milhões de brasileiros, grande parte ilegais, se amontoou.
Agora é diferente. Com a ajuda dos consulados brasileiros em Los Angeles e San Francisco, os empresários brasileiros estão fazendo de tudo para reconquistar a Costa Oeste, e daqui conquistar os países asiáticos, pois estas cidades, além de Seattle, são a porta para o Pacífico.
Nosso empresários pagam, no entanto, pela tortura da viagem de São Paulo até aqui, passando por Dallas ou Houston no Texas, ou Atlanta, na Geórgia, o que em outras palavras significa duplicar as horas de vôo entre os dois países.
Sai-se à noite do Brasil, chega-se no meio dos Estados Unidos nas primeiras horas da madrugada e pousa-se aqui quase cinco horas depois, enfrentando às vezes seis horas de fuso horário. Os brasileiros surgem aqui tresnoitados, atordoados e muitas vezes perdidos, sem energia para fazer negócios com Bill Gates ou passear na Disneylândia.
O pior é o transporte de carga. Sabe-se que o forte do tráfego aéreo é pago pela carga, acondicionada em imensos vãos um andar abaixo dos passageiros, ou em aviões especialmente desenhados para isto, os chamados cargos. Muitos dos produtos que estados como Califórnia, Oregon e Washington compram do Brasil são perecíveis, e não resistem às escalas atuais.
Por não ter linhas diretas regulares de passageiros ou de carga, ou mesmo por ser bem distante do Brasil, o frete vai ficando caro para a Costa Oeste, quando comparado a portos mais próximos. Mas os Estados Unidos, é só olhar no mapa, estão ainda mais perto do que a China, o Japão, a Europa e a África, e são os maiores compradores do planeta, inclusive do Brasil.
Só no ano passado compraram US$ 24,4 bilhões de nós, dos quais US$ 3,5 bilhões beneficiados pela isenção de impostos de importação. Muito pouco para um país que compra US$ 1,72 trilhão (isto mesmo, quase dois trilhões) de produtos e serviços de todo o mundo, dos quais apenas 1,3% originários do Brasil. Pagam em dólar, são organizados e eficientes e sempre demandam inovação e preços baixos, as bases do capitalismo eficiente.
Hoje em dia muitos brasileiros criticam os Estados Unidos por diferentes razões, desde o Governo Bush, a guerra no Iraque ou mesmo pela arrogância no trato dos negócios estrangeiros. Apesar das idas e vindas, Brasil e Estados Unidos têm histórias parecidas, com diferentes níveis de sucesso. De Carmem Miranda a Sônia Braga, de Pelé a Gisele Bündchen, somos queridos pelos nossos irmãos do norte.
Nossa língua portuguesa soa como música nos ouvidos dos gringos, nossas belezas naturais são reconhecidas e celebradas aqui. Fazemos etanol e aviões. Somos um povo afável, bonito, brincalhão, bom de fazer negócios. Só falta um avião.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

O apanhador no campo de centeio

Quem conhece Jorio Dauster sabe das suas virtudes como diplomata, negociador da dívida externa brasileira e ex-presidente da Vale do Rio Doce, além do excelente papo, da pele queimada de sol e do joie de vivre carioca.
O que pouca gente lembra é que Dauster teve a felicidade de, ainda nos anos 60, traduzir para o português, com a ajuda de dois amigos do Itamaraty, a obra prima de J. D. Salinger, O Apanhador no Campo de Centeio.
The Catcher in the Rye, no seu original em inglês, uma espécie de Bíblia dos pós adolescentes, ou “o romance que inventou uma geração”, já vendeu mais de 60 milhões de exemplares em praticamente todas as línguas e, ninguém sabe porquê, é consumido à razão de 240 mil exemplares todos os anos.
Aqui em Los Angeles, depois de uma palestra sobre biodiesel sob o patrocínio do Consulado Brasileiro e do Instituto Milken, perguntei ao embaixador o que faz um livro escrito em 1951 provocar tanto sucesso quase 60 anos depois.
O Apanhador, explica, toca as pessoas porque fala de conceitos filosóficos numa linguagem que qualquer um entende, se identifica e, portanto, gosta. Nada mais é do que uma acurada e sensível crônica da juventude.
O embaixador ainda traduziu mais 17 livros, inclusive outra obra-prima de Salinger, “Raise high the roof beam, Carpenters” (“acho que sou um neurótico ao contrário... sinto que o mundo está conspirando para que eu seja feliz”), ao qual ele deu o título de “Carpinteiros, levantem bem alto a cumeeira”.
De uns anos para cá Dauster traduziu outros autores, em especial Vladimir Nabokov, mas o “Apanhador” continua sendo um dos seus papos favoritos, mesmo porque o mistério que envolve o livro e seu autor, recluso há pelo menos meio século num sítio no Estado de New Hampshire, é também o papo favorito dos fãs de Salinger.
O escritor, que nasceu em Nova York e hoje celebra 88 anos, escreveu a maioria de suas obras entre 1940 e 1965, mas segundo a lenda continua escrevendo todas as manhãs. Seu contato com o mundo exterior é através de seu agente literário, um escudo em várias batalhas para garantir a integridade de sua obra.
O “Apanhador”, escrito na primeira pessoa, é uma viagem ao labirinto do cérebro de Holden Caulfield, de 16 anos, que detalha suas experiências em Nova York depois de ter sido expulso de um colégio interno. O livro expõe a falsidade da vida adulta, a alienação do rapaz e a inevitável perda da inocência. “Minha adolescência foi praticamente a mesma do rapaz, e foi um grande alívio contar esta história para as pessoas”, disse o autor em 1953.
Quando foi lançado, o “Apanhador” ficou na lista dos mais vendidos do The New York Times durante 30 semanas, mas, depois, foi-se tornando um culto entre os adolescentes, a ponto de, devido ao seu poder de influência, ter sido banido ou censurado em vários distritos escolares por trazer 332 palavras chulas, coisas que naquela época não ficavam bem em letra de imprensa.
Muitos professores foram despedidos ou forçados a sair das escolas por recomendar sua leitura aos estudantes, o que só provocou a curiosidade e as cópias piratas passadas de mão em mão. Salinger recebeu propostas milionárias para transformá-lo em filme, entre elas a de
Steven Spielberg. O autor, escaldado com a adaptação hollywoodiana de um de seus contos, recusou.
No Brasil, Rubem Braga e Fernando Sabino decidiram editar o livro traduzido por Dauster e seus amigos diplomatas Álvaro Alencar e Antônio Rocha após uma conversa regada a uísque na cobertura de Braga em Ipanema, no Rio.
Num recente artigo sobre a epopéia de achar um título adequado à versão para o português do The Catcher in the Rye, Dauster citou um parágrafo que diz tudo a respeito do livro que ainda hoje encanta milhões de pessoas.
“.... fico imaginando uma porção de garotinhos brincando de alguma coisa num baita campo de centeio e tudo. Milhares de garotinhos, e ninguém por perto; quer dizer, ninguém grande; a não ser eu. E eu fico na beirada de um precipício maluco. Sabe o quê que eu tenho de fazer? Tenho que agarrar todo mundo que vai cair no abismo. Quer dizer, se um deles começar a correr sem olhar onde está indo, eu tenho que aparecer de algum canto e agarrar o garoto. Só isso que eu ia fazer o dia todo. Ia ser só o apanhador no campo de centeio e tudo. Sei que é maluquice, mas é a única coisa que eu queria fazer. Sei que é maluquice.”

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

AS AVENTURAS DE STEPHEN FOSSETT

Até sexta-feira passada, quando escrevi este artigo, não sabíamos se tínhamos perdido ou não o maior aventureiro de todos os tempos, James Stephen Fossett, 63 anos, o milionário norte-americano que no ar, na água ou na terra estabeleceu 116 recordes mundiais, 76 deles ainda não batidos por ninguém.
Fossett, que já rodou o mundo num balão, atravessou o Canal da Mancha nadando, subiu seis dos mais altos picos da Terra e fez fortuna com a firma de investimentos Marathon Securities, simplesmente barberou no comando do seu avião, o Bellanca Citabria Super Decathlon, e, presumivelmente, espatifou-se nas montanhas do deserto de Nevada, no sudoeste norte-americano, no dia três de setembro.
Por ser famoso, e rico, mais de 17 aviões e helicópteros (e praticamente todas as redes de TV) procuraram por Fossett por mais de duas semanas por cerca de 26 mil quilômetros quadrados, algo semelhante, segundo um piloto, a localizar um pedaço de lata na Quinta Avenida do alto do Empire Estate Buiding, em Nova York.
Pelo mesmo motivo, e pela primeira vez que se tem notícia, os dois maiores líderes de buscas na Internet, Google e Yahoo, se dispuseram a utilizar seu rastreamento via satélite para, lá de cima, ajudarem a localizar Fossett e seu monoplano.
Coincidentemente, Fossett criou raízes em S. Louis, Missouri, onde há quase um século um grupo de investidores bancou o monoplano The Spirit of St. Louis, do herói Charles Lindbergh, que fez o primeiro vôo intercontinental em 1927 e depois teve seu filho seqüestrado e morto.
O mundo começou a prestar atenção em Fossett recentemente, quando depois de seis tentativas tornou-se o primeiro ser humano a viajar ao redor do mundo num balão. Ultrapassando Sir David Niven, do filme A Volta do Mundo em 80 Dias, demorou apenas 13 dias, 8 horas e 33 minutos.
Casado e sem filhos, Fossett é um dos poucos terrestres que podem ostentar a Medalha de Ouro da Federação Aeronáutica Internacional, FAI. Depois deste recorde, e não satisfeito, associou-se ao bilionário britânico Richard Branson para rodar novamente o mundo, desta vez dentro do Virgin Atlantic GlobalFlyer e em 67 horas. Como comandante, em 2004, deu a volta à Terra no catamarã Cheyenne em 58 dias e nove horas.
Boa parte das reportagens sobre Fossett, que nasceu numa pequena cidade do Tennessee, destacam dois aspectos: (1) o que faz um homem que depois de se aposentar dá uma de Deus, não sossega e bate 167 recordes mundiais? (2) como um aventureiro multifacetário como Fossett, capaz de subir os 9 mil metros do Himalaia ou atravessar do Canal da Mancha (34 quilômetros de Dover até o Cabo Griz-Nez) erra ao pilotar um avião que, como o Cessna, é considerado o Fusquinha dos ares?
Fossett desapareceu sem responder a estas perguntas, mas lendo sua autobiografia, “Chasing de Wind”, escrita em parceria com Will Hasley, lançada pela Virgin Publishing, surge um homem arredio, pouco afeto à mídia, escoteiro de alma e coração, que desde os 12 anos, quando nem sabia o que fazer da vida, já subia as mais altas montanhas da Califórnia. Uma personalidade bastante parecida com um dos poucos heróis que o Brasil tem, Amyr Klynk, o solitário paulistano que veio remando da África até a Bahia nos anos 80.
Fossett, como Klynk, ou o próprio Lindbergh, era, mais do aventureiro, um planejador nato, capaz de, como um jogo de xadrez ou no dia-a-dia de Wall Street, prever minuciosamente cada item de suas aventuras: preparo físico, técnica, equipamentos e mantimentos. Planejar, como muita gente sabe, é antecipar problemas, mas na manhã daquele três de setembro, Fossett, ao que parece, estava de folga e nem plano de vôo fez.
O avião decolou às 8:45 do campo de pouso conhecido como
Flying-M-Ranch, do também milionário Barron Hilton, dos Hotéis Hilton, em Nevada. Segundo a CNN, ele estava procurando por um lago adequado para bater outro recorde de velocidade.
As buscas começaram seis horas depois, já que Fossett não deu sinal de vida e sua aeronave tem apenas cinco horas de autonomia de vôo. O interessante é que não foram acionados os dispositivos de emergência para a localização do avião, que automaticamente são ligados quando o avião cai e bate no solo ou na água. Um mistério total.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Cortando a Barba e os Custos

Quando o inventor norte-americano King Camp Gillette inventou o aparelho de barbear com lâminas descartáveis, em 1901, transformou o até então perigoso e delicado ato de fazer a barba, restrito às barbearias e a alguns familiares de plantão, em um hábito tão popular feito escovar os dentes.
A jogada de mestre, no entanto, não estava na invenção em si, mas na possibilidade de vender um produto abaixo do custo, o aparelho de barbear, para fazer com que os consumidores pagassem mais pela lâmina, mantendo-os fiéis ao longo dos anos.
Este conceito, chamado aqui de loss leader, foi a mola mestra do sucesso não só da Gillette, vendida em 2005 à Procter & Gamble por US$ 54 bilhões de dólares, mas também de muitas marcas que atraem o consumidor através de produtos baratos, como a impressora à jato de tinta, para depois retê-los através dos caros cartuchos.
Warren Buffet, o segundo homem mais rico do mundo, investiu na Gillette por acreditar que jamais haverá um dia em que o homem não se levante, passe a mão na cara e sinta a necessidade de tirar aqueles pelos que significam, no mundo de hoje e com o perdão do “companheiro” Fidel, desleixo e falta de asseio pessoal.
Mas quando o CEO James Kilts chegou à empresa em 2001, o primeiro executivo de fora da corporação em mais de 70 anos, encontrou um negócio que tinha uma grande marca, mas que, por inatividade, estava perdendo a participação de mercado.
Jim, como é chamado, se assustou com prejuízos em mais de 15 quadrimestres consecutivos, as ações em baixa e Wall Street perdendo a paciência, como revelou em seu livro de memórias “Doing What Matters”, recém lançado nos Estados Unidos.
Já famoso e realizado depois de fazer um bom trabalho na Kraft e na Nabisco, Jim tinha diversas opções: ver-se livre de recentes aquisições, como a Duracell e a Braun, sair do negócio de personal care , só manter os aparelhos e as lâminas de barbear, ou simplesmente jogar a toalha e entrar num acordo com os bancos credores.
Segundo Kenneth Roman, ex-CEO da Ogilvy & Mather que recentemente fez uma resenha do livro de Jim para o The Wall Street Journal, o homem escolheu o caminho mais difícil.
Apoiado por seu time de executivos e por seus “mentores”, introduzira uma política chamada Zero Overhead Growth (ZOG), que busca controlar os custos e investir o que sobrar em pesquisa, desenvolvimento e.... marketing.
A vontade férrea de fazer do corte de custos um meio de vida (os Estados Unidos foram reeleitos semana passada campeões de produtividade entre todos os países do mundo) faz lembrar, segundo o autor do artigo, o mantra do setor de semicondutores: o preço da sobrevivência é cortar 20% dos custos todos os anos – e para sempre.
Mas Jim foi além do corte de custos, e preparou a empresa para se manter uma eterna saúde. Inventou um programa chamado de Excelência Funcional, no qual preconiza a iniciativa de fazer o melhor, com máximo desempenho, pelo menor custo, que segundo os críticos significa simplesmente demitir gente.
Aos poucos, diz Jim em sua biografia, o pessoal começou a gostar dos benefícios de uma cultura que permanentemente combate o supérfluo e desnecessário. Depois de dois anos, quando sentiu que a turma já estava amestrada neste mantra, Jim lançou mais um projeto, o Total Innovation, um programa contínuo de melhorias e inovações, inclusive de produtos que mudariam para sempre a face do mercado, como o Mach 3 e o Sensor.
Em sua biografia, o executivo, como todo vencedor que se preza, comemora os resultados. As vendas cresceram 5% depois de seu primeiro ano no posto, 10% no segundo ano e continuou aumentando, fazendo com que a ação da Gillette subisse 20% entre 2001 e 2004, chamando a atenção da gigante Procter & Gamble, que comprou a empresa e a elegeu como uma linha de seus produtos.
Já o inovador King Gillette, que deu início a este colosso empresarial e transformou seu nome na marca recorrente de aparelhos de barbear, morreu pobre e falido em Los Angeles, na Califórnia, em 1932, depois de investir dinheiro em imóveis e ter perdido quase tudo durante a Grande Depressão.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Mulher é ruim para fazer conta?

Nada disso. Cada vez mais a ciência comprova que ser bom em matemática, ou no “alfabeto com o qual Deus construiu o Universo”, como dizia Galileu Galilei, independe do sexo.
Mas a atriz Danica McKellar, a doce Winnie Cooper do seriado Tempos Incríveis, exibido no Brasil pela Rede Cultura, a cada dia encanta os americanos com o livro “A Matemática Não é Chata”, escrito de princesa para princesas para convencê-las de que o reino dos números é também coisa de mulher.
McKellar, que já foi tão ruim em matemática como boa parte da humanidade, viveu tempos incríveis na sala de aula quando, de repente, dava branco na cabeça, o coração palpitava e rezava para que o sino do recreio acabasse com a tortura de uma, digamos, raiz quadrada.
Até que um professor apareceu e deu exemplos práticos de matemática no dia-a-dia para que ela aprendesse a lição. Foi a faísca para que explodisse sua genialidade numérica, a ponto de, mesmo com carreira de atriz, ter sido autora de um tal de Chayes-McKellar-Winn, um teorema impossível de descrever aqui, pois nem eu nem você, paciente leitor, entenderíamos bulhufas.
Muita gente pensa que, com o advento da calculadora de mão, a matemática poderia ser extinta dos currículos escolares, a exemplo da Química (já experimentou decorar a tabela periódica dos elementos?) ou da Física, cuja beleza estava na frase “a toda ação corresponde uma reação igual e contrária”, muito útil nos embates da vida.
Mas a matemática, que trabalha com conceitos de quantidade, estrutura, espaço e mudança, é cada vez mais utilizada numa miríade de profissões que envolvem o reconhecimento de padrões em números, computadores, abstrações ou qualquer coisa que exista.
Ou seja, como num jogo de xadrez, leva as pessoas a pensar adiante, lidar com possibilidades, reconhecer erros e corrigi-los imediatamente (“meu segredo de sucesso”, segundo Bill Gates), criar programas de computador que imitam o celebro humano ou simplesmente calcular a gorjeta na mesa de um bar.
Mais ainda, a matemática vem sendo lugar comum nas entrevistas de emprego aqui nos Estados Unidos, onde se pergunta para o candidato “(1) quantas bolinhas de golfe cabem num ônibus escolar”, “(2) quanto você cobraria para lavar todas as janelas de Seattle” ou a pegadinha criada pela Microsoft ainda nos anos 90: “(3) - quantos postos de gasolina existem no Brasil?”. A idéia é saber se o candidato consegue pensar e, em caso positivo, se o faz com um mínimo de racionalidade.
Danica McKellar, hoje aos 32 anos, devolve a dádiva que recebeu do professor talentoso distribuindo-a para milhões de meninas nos Estados Unidos, que estão naquela idade em que não sabem se a herdeira Paris Hilton é um modelo a ser seguido ou evitado. E que, vez por outra, se sentem pressionadas pela escola ou pelos pais para resolver, desculpem o trocadilho, esta equação.
Seu livro, que tem como subtítulo “Como sobreviver à matemática na escola sem perder a cabeça ou suas unhas”, está sendo consumido aos borbotões por meninas desesperadas e mães atribuladas. Recheado de rosa e rosas, traz dicas para o dever de casa, os testes bimensais e, melhor ainda, exemplos reais, como entender as percentagens para as garotas se darem bem no Shopping Center ou proporções, de forma a torná-las excelentes chefs de cozinha.
O resto é entremeado com horóscopos, truques, enigmas, charadas, testemunhos de outras garotas e, principalmente, os resultados certos, que podem ser encontrados no site www.danicamchellar.com.
Fazer com que as garotas amem a matemática pode mudar a realidade profissional dos Estados Unidos, diz a pesquisadora Patricia Campbell, que avalia programas de matemática e ciência para a National Science Foundation. Apesar de milhões de dólares que estão sendo gastos em programas educacionais, os homens ainda vencem as mulheres em profissões essencialmente “matemáticas”, como engenharia.
-Nós levamos as meninas a encararem a matemática. Depois a usá-la. Agora teremos que fazê-las a amarem, diz Campbell.
O primeiro passo, como se vê, é ler o livro de Danica McKellar e responder corretamente às perguntas.
*Respostas: 1- 500 mil, assumindo que o ônibus que o interior do ônibus mede 20 bolas de altura, 50 de largura e 200 de cumprimento. 2.- Assumindo que Seattle tem 10 mil quarteirões, 600 janelas por quarteirão, e a 20 dólares por hora, em torno de US$ 10 milhões. 3.- 43 189 postos.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Advogados de US$ 1 mil a hora

A eleição na semana passada do advogado de Seattle William Neukom como presidente da poderosa American Bar Association, uma espécie de OAB dos Estados Unidos, está sendo vista aqui como o coroamento de uma profissão que, embora cercada de criticismo, está fazendo a fortuna de muita gente e hoje é uma das carreiras mais desejadas no mundo ocidental.
Gravata borboleta e cabelos grisalhos, o novo presidente da ABA, sócio do pai de Bill Gates (
K&L Gates) e filantropo, fez fortuna trabalhando como advogado da Microsoft durante 25 anos. Neste quarto de século, construiu as trincheiras para que a empresa resistisse às acusações de monopólio, plágio ou qualquer destes petardos contra quem lidera (ou monopoliza) o mercado.
Com discurso tranqüilo e infalível de quem está ao lado da lei (vale à pena ver a posse na
internet) Newkom não falou das fortunas que os advogados estão embolsando. Político, criticou as recentes leis que limitam a privacidade dos americanos e a demissão de nove procuradores que não rezavam na mesma cartilha republicana do presidente.
Newkom representa uma associação de mais de 400 mil advogados norte-americanos, a maior de todo o mundo, que, nos últimos tempos, tornou-se (mesmo a contragosto, pois advogado gosta de ser conhecido como homem das leis e não como empresário) óleo da engrenagem capitalista. Aqui, advogado é tão fundamental quanto médico, embora as receitas por vezes não garantam ficar livre do encarceramento e da perda dos bens.
País do litígio, onde a maioria dos filmes termina em julgamento e onde se assina contrato até para serviços de encanador, os Estados Unidos possuem um exército de meio milhão de advogados que brotam do chão ao mínimo sinal de que você, sua empresa ou seu animal de estimação provocou dano em alguém – ou vice-versa.
Aqui não existem rígidos limites impostos pelas ordens dos advogados para o marketing da profissão. As sociedades de advogados investem milhões de dólares em anúncios de 30 segundos em rede nacionais de TV (“você tem alguma doença relacionada com telhas de amianto?) ou em outdoors nas auto-entradas ( “se você se sente lesado em qualquer coisa que seja ligue para 0800-LAWYER”). A própria American Bar Association coloca em seu site
manuais de marketing para advogados.
Boa parte deste exército, no entanto, é composta de soldados rasos – advogados que ganham cerca de US$ 54 por hora, ou em média US$ 113,6 mil por ano, segundo o Department of Labour, o equivalente ao nosso Ministério do Trabalho. Mas se você trabalhar duro, seguir as regras e pagar os impostos, como diz o mantra do capitalismo norte-americano, pode cobrar bem mais.
Na semana passada, por exemplo, foi quebrado um tabu que rondava esta profissão abraçada por 25 dos 43 presidentes norte-americanos até hoje: a hora dos advogados top ultrapassou US$ 1 mil, o que garantiu a primeira página do The Wall Street Journal para uma turma de profissionais relutantes em confirmar as faturas de quatro dígitos. Mesmo a contragosto, pelo menos três sociedades de advogados confirmaram os números:
Simpson Thacher & Barlett, Cadwalader, Wickersham & Taft, e Fried , Frank, Harris, Shriver & Jacobson LLP, as três de Nova York.
Nos Estados Unidos ganhar bem não é motivo de vergonha – pelo contrário, se você ganha bem é porque vale quanto pesa. Mesmo assim, o mais famoso advogado americano, David Boies, da
Boies, Schiller & Flexner LLP, (“a litigation powerhouse”) ponderou: “É um pouco difícil imaginar qualquer pessoa que não salve vidas valer este dinheiro”. Outro advogado novaiorquinho, que preferiu não se identificar, foi mais direto: “nós advogados relutamos muito tempo em ultrapassar a barreira dos mil dólares porque achamos que nossos clientes simplesmente vomitariam”.
Entre os grandes escritórios de advocacia, a hora trabalhada pelos advogados vinha subindo em média de 6 a 7% anualmente desde o ano 2000 até chegar ao máximo de mil dólares atuais, embora às vezes possam ser incluídas “taxas de sucesso” que elevam os rendimentos dos attorneys a níveis estratosféricos.
“Mil dólares por hora tem um significado simbólico”, diz Robert Rosenberg, da
Latham & Watkins LLP. “Como o ano 2000, é apenas um número”. E é mesmo. Quem acompanha a economia americana se assusta com aquisições (ou prejuízos) de dezenas de bilhões de dólares. “Se um jogador de beisebol chega a ganhar 15 mil dólares por hora, é razoável que advogados de renome que resolvem problemas complexos cheguem a ganhar mil dólares por hora”, diz Mike Dillon, advogado da Sun Microsystems.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Como conquistar o investidor americano

Atenção empresários, empreendedores, sonhadores e aventureiros. Mesmo com os mercados financeiros degringolando mundo afora, calcula-se que os Estados Unidos investirão este ano cerca de US$ 60 bilhões em novos negócios ou em projetos que precisam de um empurrãozinho para fazer sucesso.
Desde a bolha da Internet, no fim do século passado, nunca houve tanto dinheiro disponível para fazer um website que vai revolucionar a interação entre as pessoas, uma usina que vai transformar lixo em energia ou um remédio que vai curar os nossos males, entre outras idéias que, por vezes, podem torná-lo bilionário.
Os gringos, como vocês sabem, quando se lembram de nós, nos vêem como uma ilha longínqua e paradisíaca, abatida por violência e corrupção e presidida por um ex-operário.
Quem nos conhece mais de perto nos considera desorganizados, não confiáveis (chegar na hora, terno-e-gravata, planejar com antecedência etc.) e não entendem o português ou muito menos o inglês que pensamos que falamos. Em resumo, têm tolerância zero para desculpas esfarrapadas.
Portanto, antes de conquistar os corações (e os bolsos) dos investidores, aqui vão algumas recomendações para seu projeto brilhar no coração do capitalismo.
- Faça o plano de negócios. O business plan é a bíblia do mundo empresarial americano. Descreva o problema, a solução, o tamanho do mercado, prováveis clientes, a estratégia de vendas, parceiros, o modelo de negócios, os competidores (se não houver competidores é porque o negócio não presta) e quem vai administrar. Depois adicione uma planilha Excel com números que façam sentido (e que impressionem) e, por último, apresente a proposta, de preferência irrecusável. Faça a versão para o inglês, edite de uma forma elegante e revise dezenas de vezes. Um errinho (principalmente de inglês) é fatal. Não se esqueça de fazer um resumo que fisgue o investidor em não mais de 10 minutos (veja gráfico).
- Tenha um representante nos Estados Unidos. Mesmo com o advento do Skype, MSN, videoconferência ou algo que o valha, investidor quer ver o olho de quem ele vai apostar o seu rico dinheirinho. Pode ser uma empresa especializada, um consultor ou até aquele primo de terceiro grau do seu cunhado que se mudou para cá há dez anos, desde que ele (ou ela) fale inglês como português, entenda de números e conheça o estranho palavreado do mundo dos investimentos (uma boa dica é começar pela palavra “equity”). Grande parte dos prováveis negócios entre os dois países falha porque, devido à distância, uma das partes esquece, se desinteressa ou tem preguiça de fazer o follow up. Pague o justo (existem todos os tipos de preços) e, no máximo, ofereça bônus caso o negócio dê certo. Os consultores daqui costumam fazer dos Estados Unidos um bicho de sete cabeças, mas eles estão blefando a maior parte do tempo. Os americanos são como nós, só que fazem o dever de casa.
- O ideal é ter um pé aqui. O melhor dos mundos, no entanto, é que você tenha uma filial aqui que possa servir de interlocutora. Hoje em dia, o investidor não quer apenas depositar o dinheiro na conta, mas sim participar ativamente do processo, colocando a mão na massa ou metendo o bedelho através dos chamados conselhos de administração, ou boards. Como estar longe dos olhos é estar longe do coração, os empreendedores daqui, mesmo que não tenham idéias tão geniais quanto a sua, acabam levando vantagem e comendo o maior pedaço do bolo.
- Em Roma, como os romanos. Notícias sobre corrupção, violência, caos aéreo etc. deixam o investidor americano, que tem medo até da sombra, inseguro. Pode parecer conversa de Polyana, mas eles acham que fazer negócios corretamente não é apenas a melhor maneira de fazer negócios, mas a única forma. Por que aqui, caso você não jogue sob as regras, como eles dizem, há uma grande chance de você ir para a cadeia ou simplesmente ser expulso e nunca mais voltar ao mercado. Portanto, seja transparente. Mostre que você acorda cedo e dorme tarde, que os funcionários estão unidos e entusiasmados e que os clientes estão batendo à porta. Planeje e execute a longuíssimo prazo. Planilhas Excel semanais e coloridas com todos os números do negócio são recomendáveis. Ao contrário de nós, os americanos detestam surpresas.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Produtos Chineses? Não, Obrigado

Está certo que um entre cada cinco seres humanos seja chinês, que precisa comer, se vestir, ganhar dinheiro e criar filhos. Mas é injusto que o progresso da China esteja sendo feito à custa da estagnação econômica e social em países pobres como o Brasil, México e outros que também possuem mão de obra iletrada, barata e disponível.
Os Estados Unidos ainda não se mexeram porque boa parte do seu débito, cerca de US$ 4,9 trilhões, está nas mãos dos chineses, que por não possuírem proteção do Estado poupam em média 45% do que ganham. E, também, porque podem rodar a maquininha de fazer dólar e são criativos para criarem novas necessidades e novos empregos, como se viu nos últimos anos com o advento da Internet.
Aqui, no entanto, está fazendo sucesso um livro da jornalista Sara Bongiorni,
A Year Without "Made in China": One Family's True Life Adventure in the Global Economy, relato da experiência de uma família que ficou um ano sem consumir qualquer produto (ou ingrediente, ou peça ou qualquer coisa) chinês. Bongiorni não chegou a passar fome, mas de repente ficou sem cafeteira, sem televisor e sem muitas outras coisas porque simplesmente, como se sabe, a China virou a fábrica do mundo.
Só que esta fábrica está vendendo produtos que podem trazer grandes riscos para a saúde e, até, matar consumidores de pastas de dente, bicicletas, pneus, tiragostos e até comida para animais de estimação. Pelo menos seis agências federais norte-americanas estão lutando para avisar os desavisados (
www.recalls.gov). Além de produtos envenenados , aqui vão outras razões para evitarmos artigos chineses.
- A China é uma ditadura. É mesmo, e das piores. É impossível calcular o número de dissidentes que mofam em suas prisões porque ousaram ser livres. Não há direito de expressão, organização, religião, voto, trabalho etc. É um comunismo hipócrita onde nove entre cada dez milionários são dirigentes da camarilha que se instalou no poder desde Mao Tse Tung. Há fatos que soam bem aos ouvidos de muita gente, como corruptos levando balas na cabeça em estádios (e a família tem de pagar pela bala) mas, para quem viveu sob ditaduras, liberdade (com justiça) é tudo.
- A China destrói a natureza. Segundo a Organização Mundial da Saúde, sete em cada dez cidades mais poluídas do mundo estão na China. Vários estudos estimam que a poluição custe à economia chinesa cerca de 10% do Produto Interno Bruto. Desde 2002, o número de reclamações às autoridades do meio ambiente aumenta 30% ao ano, chegando a 600 mil em 2004. Com uma economia baseada na queima de carvão, há cidades onde é difícil respirar.
- A China utiliza mão de obra escrava. Um empresário de Seattle fabricava artigos aqui pagando mil dólares para o trabalhador norte-americano. Mudou-se para o México nos anos 90 pagando 125 dólares para cada empregado. Agora, paga 25 dólares por mês aos chineses. Está achando caro e por isto está procurando uma forma de se estabelecer no Vietnã. Com esta exploração da mão de obra, Karl Marx deve estar se revirando no túmulo.
- A China é a rainha da pirataria – Chegam a cúmulo de copiar carros, como o Chevy, da General Motors. A principal atração turística de Pequim não é a Cidade Proibida, mas um mercado de quinquilharias chamado Pearl Market, um prédio de seis andares onde se pode comprar todas as “marcas” famosas. O governo se gaba de ter reduzido a pirataria de softwares de 92 para 82%. Está certo que os piratas e contrabandistas, como dizia o finado Roberto Campos, são os heróis do capitalismo, mas sem direitos autorais não há invenções.
- A China é corrupta – Somente em 2006 cerca de 60 mil funcionários do governo foram presos por corrupção. Há pouco tempo, o diretor do FDA chinês, Zheng Xiaoyu, foi executado por aceitar propinas no valor de US$ 850 mil de oito companhias farmacêuticas para aprovar remédios que levaram à morte mais de 10 pessoas. Em 2007 chineses já foram obrigados a fazer recall de vários produtos nos Estados Unidos, especialmente na área de comidas de animais e brinquedos infantis.
É certo que a China está demonstrando ao mundo que os produtos e serviços podem ser feitos ou ofertados por um preço ínfimo, criando um novo paradigma que muita gente chama de leilão reverso. Se países que respeitam as regras do livre mercado não reagirem, a China vai acabar com as possibilidades de sermos, um dia, uma nação desenvolvida – e democrática.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Um mórmon no poder

Rico, bonito, empresário de sucesso, pai e marido exemplar, sem antecedentes criminais (nem multa por velocidade), republicano e mórmon. O ex-governador de Massachusetts, Mitt Romney, 60 anos, o homem que salvou as Olimpíadas de Salt Lake City em 2002 e fez fortuna com a firma de investimentos Bain Capital, é um dos candidatos mais afluentes entre os republicanos para a sucessão de George Bush – a ponto de ter sido capa de praticamente todas as revistas de negócios desde que o ano começou.
Romney, no entanto, peca por ser mórmon. O país está cansado da mistura entre Igreja e Estado que os neoconservadores encabeçados por Bush promoveram nos últimos anos, a ponto de levarem o país a uma guerra fratricida e sem sentido no Iraque só para satisfazer ao complexo industrial militar. Os mórmons pertencem à religião que mais cresce nos Estados Unidos, embora seja mais conhecida entre outros credos por abrigar entre seus devotos os chamados casamentos múltiplos (um homem, às vezes com dezenas de esposas), especialmente em regiões remotas do país.
Em todos os debates que participa, Mitt é confrontado com perguntas sobre a influência da religião no poder, especialmente na tomada de decisões que apaixonam os Estados Unidos atualmente, como a liberação de fundos federais para a pesquisa de células-tronco, direito ao aborto, casamentos entre homossexuais e outras conquistas (ou atrasos, segundo os neoconservadores) da sociedade norte-americana no fim do século passado. Mitt, como bom político, escorrega-se dos petardos com a firmeza de um quiabo, mas no final do dia, como todos sabem, o que vale é uma boa administração.
É neste ponto que Mitt é fantástico. Ele é uma espécie de SWAT que chega com um time de craques para resolver qualquer problema do mundo dos negócios. Formado por Haward (entre os cinco melhores alunos), cresceu como consultor na Bain & Company, mas desiludiu-se ao notar que seus conselhos não eram seguidos. Propôs, e tornou-se sócio, da Bain Capital, que com apenas US$ 37 milhões para investir fez o sucesso de empresas como Brookstone, Sealy, Domino’s Pizza e Staples, na qual colocou US$ 600 mil e hoje fatura US$ 18 bilhões.
Como este formidável DNA de administrador, Mitt foi chamado às pressas para salvar as Olimpíadas da Inverno de 2002, em Salt Lake City (reduto dos mórmons). Em 1999, durante os preparativos, os jogos estavam a perigo, com escândalos de corrupção e US$ 379 milhões de saldo negativo. O homem chegou, cortou custos, arranjou novos patrocinadores e, ao final da competição (“trabalhar lá era como enfrentar um final de uma copa do mundo 17 vezes em 17 dias”) ainda obteve um lucro de US$ 100 milhões.
Foi o passe para lançar seu nome nacionalmente. Em 1994, já tinha tentado arrancar o democrata Ted Kennedy a quase centenária invencibilidade como senador de Massachusetts, mas foi dizimado como uma saraivada de anúncios na TV afirmando que sua atuação na Bain Capital, comprando e vendendo empresas, levou à demissão de milhares de funcionários (e eleitores). Perdeu a eleição para o Senado, mas foi eleito governador do Estado de 2002 a 2006. Lá, virou a mesa transformando um déficit de US$ 3 bilhões num superávit de US$ 1 bilhão, criou seguro saúde universal que hoje é referência nos Estados Unidos e ainda um arrojado plano para proteger a ecologia. Tornou-se, também, presidente da Associação dos Governadores Republicanos, outra plataforma para chegar à Casa Branca.
Como empresário, o forte do candidato Mitt Romney (apenas 11% de preferência nas pesquisas) é obter dinheiro, mas muito dinheiro para eleger-se presidente dos Estados Unidos. É o candidato republicano que mais arrecadou (US$ 23 milhões), embora não tenha superado a favorita dos democratas, Hillary Clinton, que conseguiu, com o apoio do marido, o ex-presidente Bill Clinton, cerca de US$ 26 milhões. O que mais está surpreendendo os analistas é como Romney está conseguindo levantar dinheiro através de pequenas doações no seu site na internet.
Romney poderia ser católico, protestante, judeu, muçulmano ou ateu, mas o fato de ser mórmon o joga numa zona de incerteza pelo próprio desconhecimento que a maioria das pessoas tem da igreja fundada nos Estados Unidos pelo visionário Joseph Smith em 1830 e que hoje conta com mais de 13 milhões de adeptos só nos Estados Unidos. Como é comum não gostarmos daquilo que não conhecemos, por insegurança ou medo, fica difícil saber o que um mórmon vai fazer na Casa Branca.

Um mórmon no poder

Rico, bonito, empresário de sucesso, pai e marido exemplar, sem antecedentes criminais (nem multa por velocidade), republicano e mórmon. O ex-governador de Massachusetts, Mitt Romney, 60 anos, o homem que salvou as Olimpíadas de Salt Lake City em 2002 e fez fortuna com a firma de investimentos Bain Capital, é um dos candidatos mais afluentes entre os republicanos para a sucessão de George Bush – a ponto de ter sido capa de praticamente todas as revistas de negócios desde que o ano começou.
Romney, no entanto, peca por ser mórmon. O país está cansado da mistura entre Igreja e Estado que os neoconservadores encabeçados por Bush promoveram nos últimos anos, a ponto de levarem o país a uma guerra fratricida e sem sentido no Iraque só para satisfazer ao complexo industrial militar. Os mórmons pertencem à religião que mais cresce nos Estados Unidos, embora seja mais conhecida entre outros credos por abrigar entre seus devotos os chamados casamentos múltiplos (um homem, às vezes com dezenas de esposas), especialmente em regiões remotas do país.
Em todos os debates que participa, Mitt é confrontado com perguntas sobre a influência da religião no poder, especialmente na tomada de decisões que apaixonam os Estados Unidos atualmente, como a liberação de fundos federais para a pesquisa de células-tronco, direito ao aborto, casamentos entre homossexuais e outras conquistas (ou atrasos, segundo os neoconservadores) da sociedade norte-americana no fim do século passado. Mitt, como bom político, escorrega-se dos petardos com a firmeza de um quiabo, mas no final do dia, como todos sabem, o que vale é uma boa administração.
É neste ponto que Mitt é fantástico. Ele é uma espécie de SWAT que chega com um time de craques para resolver qualquer problema do mundo dos negócios. Formado por Haward (entre os cinco melhores alunos), cresceu como consultor na Bain & Company, mas desiludiu-se ao notar que seus conselhos não eram seguidos. Propôs, e tornou-se sócio, da Bain Capital, que com apenas US$ 37 milhões para investir fez o sucesso de empresas como Brookstone, Sealy, Domino’s Pizza e Staples, na qual colocou US$ 600 mil e hoje fatura US$ 18 bilhões.
Como este formidável DNA de administrador, Mitt foi chamado às pressas para salvar as Olimpíadas da Inverno de 2002, em Salt Lake City (reduto dos mórmons). Em 1999, durante os preparativos, os jogos estavam a perigo, com escândalos de corrupção e US$ 379 milhões de saldo negativo. O homem chegou, cortou custos, arranjou novos patrocinadores e, ao final da competição (“trabalhar lá era como enfrentar um final de uma copa do mundo 17 vezes em 17 dias”) ainda obteve um lucro de US$ 100 milhões.
Foi o passe para lançar seu nome nacionalmente. Em 1994, já tinha tentado arrancar o democrata Ted Kennedy a quase centenária invencibilidade como senador de Massachusetts, mas foi dizimado como uma saraivada de anúncios na TV afirmando que sua atuação na Bain Capital, comprando e vendendo empresas, levou à demissão de milhares de funcionários (e eleitores). Perdeu a eleição para o Senado, mas foi eleito governador do Estado de 2002 a 2006. Lá, virou a mesa transformando um déficit de US$ 3 bilhões num superávit de US$ 1 bilhão, criou seguro saúde universal que hoje é referência nos Estados Unidos e ainda um arrojado plano para proteger a ecologia. Tornou-se, também, presidente da Associação dos Governadores Republicanos, outra plataforma para chegar à Casa Branca.
Como empresário, o forte do candidato Mitt Romney (apenas 11% de preferência nas pesquisas) é obter dinheiro, mas muito dinheiro para eleger-se presidente dos Estados Unidos. É o candidato republicano que mais arrecadou (US$ 23 milhões), embora não tenha superado a favorita dos democratas, Hillary Clinton, que conseguiu, com o apoio do marido, o ex-presidente Bill Clinton, cerca de US$ 26 milhões. O que mais está surpreendendo os analistas é como Romney está conseguindo levantar dinheiro através de pequenas doações no seu site na internet.
Romney poderia ser católico, protestante, judeu, muçulmano ou ateu, mas o fato de ser mórmon o joga numa zona de incerteza pelo próprio desconhecimento que a maioria das pessoas tem da igreja fundada nos Estados Unidos pelo visionário Joseph Smith em 1830 e que hoje conta com mais de 13 milhões de adeptos só nos Estados Unidos. Como é comum não gostarmos daquilo que não conhecemos, por insegurança ou medo, fica difícil saber o que um mórmon vai fazer na Casa Branca.